sábado, 31 de maio de 2008

Humanismo

O acaso fez com que no dia 11 de Setembro de 2001 estivesse a dar aulas a jovens físicos europeus, numa Escola de Verão organizada pela Universidade do Algarve. O fim das minhas aulas coincidiu com o narcisismo póstumo dos fanáticos religiosos de hoje e vivemos, em directo e incrédulos, o que se estava a passar em Nova Iorque. O homem tinha inventado uma nova forma de violência. Valeu-me o meu pequeno telescópio, uma noite calma de fim de Verão e as minhas terras da Serra Algarvia para que evasões, que a formação do físico estimula, me permitissem partir para longe do nosso planeta e da nossa época. Imaginei que, à volta desta ou daquela estrela que estava a ver na direcção do sagitário e das suas nebulosas, havia um planeta com características físicas diferentes do nosso: outra massa, outro campo magnético, outra inclinação do eixo de rotação, outra evolução geológica, onde uma vida inteligente tivesse evoluído de maneira diferente da nossa e onde as características privilegiadas pela selecção das espécies tivessem sido mais cooperação e menos individualismo, mais solidariedade e menos competição, mais tolerância e menos fanatismo. Esses seres inteligentes poderiam até ter menos unidades funcionais que os nossos cem mil milhões de neurónios, talvez não organizadas em hemisférios, mas as conexões entre elas talvez tivessem privilegiado mais o que une e não o que separa, isto é, aquilo a que chamamos, no nosso pequenino planeta azul, Humanismo.
Manuel Paiva, Como respiram os Astronautas, Gradiva, 2004 (Manuel Paiva nasceu no Porto em 1943 e fixou-se em Bruxelas em 1964, tendo-se licenciado e doutorado na Universidade Livre de Bruxelas. É professor de Física na Faculdade de Medicina da mesma Universidade e director do Laboratório de Física Biomédica. Participou em dez missões espaciais e é presidente dos Fundos Educativos da Agência Espacial Europeia, associados à Estação Espacial Internacional)

Amy Winehouse - Love Is A Losing Game

Apesar de todos os problemas e de espetáculos menos conseguidos, continua a ser uma grande voz.

"Indiana Jones and the Kingdom of the Crystal Skull"

Lucas, Spielberg e Ford estão de volta...

deixa-te

Sinto um vazio no sopé da esperança
Assim que renovas essa tua ameaça:
Os tempos idos de bem-aventurança
São futuros próximos de desgraça.

Só porque teimas no propósito louco
De eu me te dar por inteiro e uno,
Partindo do que é dado ser tão pouco
E eu não ter categoria nem aprumo.

Deixa-te dessas coisas, mulher lilás
Dou o que dou; é só isso que posso
Mais do que isso sei já não ser capaz
E outras exigências nem te as oiço.

Deixa-te...

teimoso


O Cosmos de Einstein

Assim que nos apercebemos que o espaço pode ser curvo, emerge uma nova imagem, desconcertante. Pensemos numa pedra pesada em cima de uma cama. A pedra afunda-se um pouco. Agora atiremos um pequeno berlinde para cima da cama. O berlinde não vai mover-se numa linha recta, mas numa linha curva, em redor da pedra. Há duas maneiras de analisar este efeito. À distãncia, um newtoniano poderia dizer que há uma "força" misteriosa que emana da pedra para o berlinde, obrigando-o a alterar o seu percurso. Esta força, mesmo que invisível, alcança e atrai o berlinde. No entanto, um relativista vê uma imagem completamente diferente. Para este, olhando a cama de perto, não há nenhuma força a atrair o berlinde, há apenas a depressão da cama, que dita o movimento do berlinde. À medida que se vai movendo, a superfície da cama "empurra" o berlinde até que este passa a deslocar-se num movimento circular.

Agora substituímos a pedra pelo Sol, o berlinde pela Terra e a cama pelo espaço e o tempo. Newton diria que uma força invisível chamada "gravidade" atrai a Terra e a mantém em torno do Sol. Einstein responderia que não há qualquer atracção gravítica; a Terra é deflectida em torno do Sol porque é a curvatura do próprio espaço que está a empurrar. De certo modo, a gravidade não atrai, mas o espaço empurra.

De acordo com esta imagem, Einstein conseguia explicar porque razão qualquer perturbação no Sol levaria oito minutos a chegar à Terra. Por exemplo, se de repente retirássemos a pedra, a cama recuperaria imediatamente a sua forma normal, criando ondas que se deslocariam, a uma velocidade definida, através da cama. Da mesma forma, se o Sol desaparecesse, criaria uma onda de choque de espaço distorcido que se deslocaria à velocidade da luz. Esta imagem era tão simples e elegante que Einstein conseguiu explicar a ideia essencial a Eduard, seu filho mais novo, que lhe perguntou por que é que ele era tão famoso. Einstein respondeu: "Quando um besouro cego rasteja sobre a superfície de um ramo curvo, não repara que o caminho que percorreu é, na realidade, curvo. Eu tive a sorte de reparar naquilo em que o besouro não reparou".

Michio Kaku, O Cosmos de Einstein, Gradiva, 2005 (Michio Kaku é professor de Física Teórica na City University e no City College de Nova Iorque. è autor de programas na Rádio e na Televisão e de vários livros de ensino ao nível do doutoramento que constituem leitura obrigatória nas mais prestigiadas universidades do mundo).

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Lobo Antunes



um Lobo Antunes dos melhores tempos, se assim pode dizer-se. humor e ironia bastantes e uma escrita elegante. uma ideia para uma "leitura danada".

Banksy

Banksy é um dos mais conhecidos artistas de rua do mundo. Os seus “stencils” são facilmente encontrados nas ruas de Londres. Nascido em Bristol, no Reino Unido, em 1975, iniciou a sua actividade aos 14 anos, tendo sido expulso da escola e preso por pequenos delitos.
Sua obra é carregada de conteúdo social expondo claramente uma total aversão aos conceitos de autoridade e poder. Em telas e murais faz suas críticas, normalmente sociais, mas também comportamentais e políticas, de forma agressiva e sarcástica, provocando nos seus observadores, quase sempre, uma sensação de concordância e de identidade.

Interregno

Nasceu e aprendeu a andar pelos campos, enquanto os seus pais trabalhavam a terra em troca de um mísero naco de pão. Os Invernos sempre foram frios e a roupa nunca foi suficiente, por isso desde novo se habituou ao desconforto e à dor; por isso poucas coisas lhe pareciam absurdamente ridículas. Desde novo que as rugas sulcavam o seu rosto, conferindo-lhe diferentes dimensões de expressividade.
Nasceu e cresceu na simplicidade das dificuldades que lhe marcaram a vida. Ainda hoje carrega esses traços de personalidade consigo. Por isso mesmo teve de regressar, mas nunca tinha imaginado que a iria reencontrar.

dá-me

Verdes eram os olhos da cor do poema
com que cantaste o enredo da conquista
e eu enrolei-me em ti e na restante cena
e muito confundi a nobre arte e a artista.

Dizem, olhares verdes são falsos
Ainda assim, não apago a devoção
Iria de novo e em pés descalços
rogar-te um só bafo do coração.


Dá-me...

ri

Vermelho é o riso
de teu olhar amigo.
Esse que me é preciso.
Esse que me foge o perigo.

Quando tomba a noite escura
e o negro engole esse vermelho
iludo-me são, mas é loucura
ver-te a ti ao olhar o espelho.

Ri...

deixa

Deixa que pinte de azul
o resto do teu dia.
Como se fizesse Sul
em toda a fantasia.

E fossemos beber do mar
em rebolões de fina areia.
Como se voltar a amar
fosse sempre vez primeira.

Deixa...

O ALFA NUNCA ESPERA

Uma singela homenagem à cidade do Mondego, primeira saudada, e àquela que é a pior estação do mundo, a B.

Jean-Michel Basquiat


Jean-Michel Basquiat nasceu em 1960 em Nova Iorque e morreu em 1988.
Ganhou popularidade a pintar Graffitis na cidade onde nasceu. Em 1977, aos 17 anos, Basquiat e um amigo, Al Diaz, começaram a fazer Graffitis em prédios abandonados. A assinatura era sempre a mesma: "SAMO" ou "SAMO shit" ("same old shit").
No fim da década de 1970, Basquiat formou uma banda chamada Gray, com o então desconhecido músico e actor Vincent Gallo. No entanto, Basquiat só começou a ser mais amplamente reconhecido em Junho de 1980 quando participou do The Times Square Show, uma exposição de vários artistas patrocinada por uma instituição de nome "Colab", onde foi catalogado como Neo-expressionista.

Caril...

Fora de brincadeira, até que se pode dizer ser do melhor em termos de música étnica.

Anoushka Shankar

Roth

e, já agora... enquanto
se espera a versão portuguesa
deste grande Senhor Roth

e para não perder o hábito


Easton Ellis


estava com saudades deste Ellis primeiro.
sempre bom de reler.

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Davi


Será Homem ou um Deus?



madeira

madrugada

A Aurora? - Vem aí,
gritou-me a aurora.
Corri e, quando saio,
louco, porta fora...

vinha o azul do dia.
Um pássaro pia alegria.
E eu, ali naquele segundo
troquei o dormir p'lo mundo.

Ah! Todos os dia vem
como se fosse a mãe
do nosso encanto.
Durmo. Após novo olhar d'espanto.

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Sereia ou Mulher


Será Sereia ou Mulher?

Arvoro

Enquanto olhava a rua não conseguia, por muito que tentasse, deixar de ouvir os ruídos que ela fazia no quarto ao lado do seu. Ouvia os passos os ruídos da cama e todos os outros móveis. Imaginava de uma forma quase pura o seu despir, a forma como ela arrumava a roupa, o corpo nu, os seios e o sexo obscuro, ternamente doce, de tal forma que só a memória diluída ou a imaginação podem conceber.

E voltando ao espaço

Sem querer concorrer com os ilustres

ELA

Para P. (com aquela ideia que se ele pode ser o Carlos de Hanover, pode ser o que for...)

Com vagar e em tempo

Ao Sábado, Camilo gostava de almoçar como devia ser - com calma, com vagar e a ler o jornal desportivo. E todos os Sábados lá ia ao café "Tróia", num gesto irrepetido, que a erosão do hábito semanal de tantos anos lhe tinha acabado por imprimir.
As regras costumeiras estavam tão enraizadas, naquela gostosa cumplicidade que mantinha com Pessanha, o empregado de mesa, sempre bem-disposto e de resposta bem lembrada e artilhada - ainda que sem qualquer malícia -, que até as piadas trocadas eram, há muito, as mesmas.
"Ò Senhor Camilo, então hoje não está com pressa?" - perguntava o bom do Pessanha.
"Hoje não, meu rapaz" - respondia Camilo, no suspirar satisfeito de quem se sentia dono do tempo, porque em dia de descanso.
"Olhe, já pelo sim pelo não, eu hoje atrasei o relógio do patrão".
"Ai sim? Como é que o fizeste, meu rapaz?" - inquiria o velho Camilo.
"Então, como? Pus uma rolha no buraco da bacia!" - atirava-lhe Pessanha.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Pressa

De olhar nervoso, Camilo ia olhando para o helénico relógio que estava junto ao balcão de mármore do café "Tróia".
E por cada pingo, por cada gota de água que via cair para o cristalino recipiente colocado por baixo daquela estranha bacia furada, agitava-se um pouco mais... Cada vez mais impaciente e exasperado.
Da sua pequena mesa quadrada - também em tons de alabastro e com rebordos de madeira escura a condizer com a cadeira em couro tratado -, sorvendo o resto do digestivo brandy, Camilo persistia e aliterava:
"Pssst! Pssst! Ò Pessanha, vamos lá! Faz-me a conta do almoço que já estou atrasado para o trabalho!".

Geek Review, Tour de Blog

A recuperar um conceito que encontrei aqui (este, um post entre muitos que a senhora bibliotecária intitula de, precisamente, "tour de blog") , venho, como não podia deixar de o fazer - por razões sobejamente conhecidas de quem me é próximo -, venho, dizia, dar conta de um achado em que tropecei numa sessão de login na blogosfera.
De facto, para um fã confesso da série de ficção científica "Battlestar Galactica" (desde os seus primórdios, logo ali, no início dos anos oitenta, finais de setenta) o blog que, por estes dias, é tido como digno de nota pela equipa deste nosso "bem-amado" servidor, revela-se como a excelente combinação dos ingredientes necessários à ficção científica, no sentido de se afirmar enquanto manifestação cultural séria e coerente; longe, pois, de qualquer juízo pejorativo e redutor que a possa remeter para uma "coisa-de-tótós".
The Sience of Battlestar Galactica propõe-se, assim, dar uma sólida visão mais "pop" (e naturalmente também "geek" com estilo, claro) - o que aqui está longe de ser algo de negativo - sobre variados temas científicos, que vêm servindo de base aos episódios da nova série épica.
As próprias estórias que ali se contam, servem aqui de mote para umas quantas glosas sobre astronomia, biologia, química, física, etc.
Na minha opinião, "a very nice treat", ficando aqui a deixa: "Some believe that Science began here..."

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Tempo


Existir

“O que vocês querem fazer da vida?” Perguntou a Maria, carregando a resposta na pergunta, mas eu só conseguia pensar que raio estava a fazer com estas pessoas que nada têm a ver com a minha história. Estas pessoas nasceram e cresceram no meio da abundância e do sucesso, nada sabem daquilo que eu e a maioria deste país somos feitos. Eu sou herdeiro da miséria, carrego a fome como herança genética e tenho o insucesso como garantia. O que quero fazer da vida? Existir é, para alguém como eu, a imensidão da totalidade, aquilo que mais incomoda a realidade.

Originalmente publicada em estranhoanjo

4 + 1

Como a poesia pura pode esquecer a língua.
Para T. (com ramo de m.)

Young Marble Giants - ' Brand - New - Life'

30 de Maio, na casa da Música do Porto. Só para os que tiverem a sorte de conseguir bilhete.

Mas continuam a ser maravilhosos...

domingo, 25 de maio de 2008

Portugal, Twelve Points, Le Portugal, Douze Points

Durante anos e anos, seria esta a frase que eu queria ouvir de um modo muito mais repetido do que alguma vez realmente o foi. De facto, era num misto de orgulho e de esperança, quase futebolística - a qual, por estes tempos de uns aquilinos vôos mais "rasantes" me tem vindo a ajudar a aguentar o despautério em tons de encarnado - que, todos os anos, eu alimentava esse sonho de ver Portugal a vencer o Festival da Eurovisão.
"Este ano é que é! A canção é excelente!" - o pensamento que anualmente ia fervendo em renovado nervoso miudinho até à noite de Sábado, de um Maio que se queria Primaveril, anunciando a chegada do tempo quente.
Contudo, como a história cruamente o confirma, nunca vi tal "alegria" concretizada.
De qualquer modo, é com saudade que lembro os tempos em que o País parava para se reunir em frente à televisão e assistir, no mesmo registo de expectativa, a esse evento da música ligeira europeia, algumas famílias até arriscando-se a dar as suas próprias pontuações, nessa famosa escala de 1 a 12, não havendo setes, nem noves, nem onzes.
Noruega, Bélgica, Itália, Suécia e Irlanda (esta última, com uma dinâmica de vitória incessante até 1995 e recuperada no ano seguinte), alguns dos países que sempre vimos a vencer, somando e seguindo na contagem dos pontos atribuídos pelos júris de cada estado-membro da U.E.R (a União Europeia de Radiodifusão), e dispostos num sempre colorido quadro de bandeiras, que aparecia na segunda parte do programa. Na verdade, posso até dizer que comecei a identificar os países europeus e do Mediterrâneo, de acordo com as suas cores, graças ao Festival da Eurovisão.
Uns dizem que é "kitsch", outros que é o puro "pop" do Velho Continente (onde ficam, pois, os ABBA?). Para mim, naquilo que me interessa, o Festival da Eurovisão é algo de mais subjectivo - a minha primeira tomada de consciência de um imaginário nacional que sempre quis ser maior, que sempre buscou o reconhecimento das outras culturas ditas "mais esclarecidas", a suspirar de conformismo por continuamente perder até "a feijões". E curiosamente, nunca deixei de encontrar correspondência disso mesmo em alguns temas que levámos a tais paragens de palcos maiores. "Conquistador" dos Da Vinci, "Lusitana Paixão" da Dulce Pontes ou até mesmo "O Meu Coração não tem Cor", da Lúcia Moniz - até hoje, a nossa melhor prestação -, são exemplos de como sempre insistimos em mostrar o nosso saudosismo por tempos de abundância e pretenso poder.
Por sua vez, temas como "Amor de Água Fresca" (Dina, Malmöe, 1992) ou aquela do "Quando Cai a Noite na Cidade" (Anabela, Irlanda, 1993), deram uma certa cor ao nosso contributo pátrio.
De outro lado, ainda guardo grande ressentimento por alguns intérpretes e autores nacionais que marcaram a sua presença no Eurofestival com canções paupérrimas - Nevada ("Neste Barco à Vela"), uns tipos madeirenses, Tó Cruz ("Baunilha e Chocolate") ou até mesmo Célia Lawson ("Antes do Adeus" - uma triste "colagem, que terminou com zero pontos!), nem tentem aparecer-me à frente!
De qualquer modo, outros tempos vieram, mercê das vontades que se mudaram, mercê do xadrez que se inverteu, e não deixa de ser curioso notar o seguinte: hoje em dia, são os antigos países do Leste Europeu que dão cartas em tal espectáculo. Ainda este Sábado, foi a Rússia que venceu na Sérvia e que agora tem a responsabilidade de, no próximo ano, organizar as duas semi-finais e a finalíssima de um modelo que retirou a uns quantos "entendidos" o poder de eleição da melhor música - por muito que possa custar ao senhor Eládio Clímaco ou até mesmo à Senhora Isabel Bahia (a prata da casa da RTP para estas andanças).
Mesmo assim, mais curioso de notar é ainda o facto de Portugal ter passado por tal mudança de hegemonia, igual a si próprio - um perdedor com umas quantas vitórias morais e sempre a dizer, pela boca dos derrotados, que "sai de cabeça erguida"... talvez como a Selecção.
Enfim, pode ser que seja para o ano! Pode ser que, para o ano, o que mais se ouça seja: "Portugal, Twelve Points, Le Portugal, Douze Points.
PS: Em abono do orgulho nacional, é conveniente dizer que, após quatro anos de derrotas humilhantes, passámos, este ano em Belgrado, à finalíssima onde até acabámos em 13º lugar (num total de vinte e cinco participantes), com 69 (sessenta e nove) pontos... Não está nada mal, Vânia Fernandes!...

Também na esplanada, à beira da Catedral.

Cântico Negro

DESIDERATOS, AINDA.
Na voz de quem bem diz.
Para D. (o jantar está em falta...)

Desiderata MV

DESIDERATOS

Despertar

O tempo parecia estagnado, irreal. Nem o frio, que entrava no quarto pelas frinchas das janelas, lhe parecia real; parecia-lhe apenas o continuar de um Inverno já muito antigo, do qual ele não se lembrava do início e que ininterruptamente continuava ano após ano, dia após dia.
Olhou pela janela do primeiro andar, onde vive há pouco mais de uma semana e observou a rua em frente. As pedras, sujas de lama e merda de animais, escurecidas pelo tempo, formavam uma calçada disforme, que lhe parecia desprovida de sentido, porque se mostrava incapaz de manter uma continuidade, incapaz de ligar aquela pequena aldeia ao resto do mundo.
Acendeu um cigarro, tentando afastar o tédio. Nesse momento passou lentamente um senhor, já com uma certa idade, tão carregado, que Sisifo se sentiria aliviado a vê-lo. E assim ficou pacientemente encostado à janela, deixando que o cigarro se consumisse lentamente entre os seus dedos…

sábado, 24 de maio de 2008


Desiderata

Go placidly amid the noise and haste,
and remember what peace there may be in silence.
As far as possible, without surrender, be one good terms wiht all persons.
Speak your truth quietly and clearly, and listem to others,
even to the dull and ignorant; they too have their story.
(....)
Beyond a wholesome discipline, be gentle with yourselt.
You are a child of the universe no less than trees and the stars,
you have a rigth to be here. And whether or not it is clear to you
no doubt the Universe is unfolding as it should.
Therefore be at peace with God, whatever you conceive Him to be.
And whatever you labors and aspirations,
in the noisy confusion of life, keep peace whit your soul.
Whit all it sham, drudgery and broken dreams, it is still a beautiful world.
Be cheerful. Strive to be happy.
Max Ehrman, 1926

sexta-feira, 23 de maio de 2008


O som do Big Bang

Considerando a teoria do Big Bang, o Universo, nos seus primeiros momentos, seria suficientemente denso e pequeno para permitir a propagação de ondas sonoras. Esta hipótese foi apresentada por Mark Whittle, professor e astrónomo da Universidade da Virgínia, em Junho de 2004. No seu entender, o Big Bang terá sido silencioso, mas um bramido crescente de sons originou-se, à medida que a matéria era criada e se expandia, em infinitas explosões estelares. Whittle descreve o ambiente musical inicial como de "majestosos acordes com terceira maior", os quais lentamente se substituíram por "melancólicos acordes de terceira menor".
É possível, segundo aquele astrónomo, admirar esta evolução sonora e ouvir, em 5 comprimidos segundos, os sons dos primeiros 400 mil anos do Universo. Para esse efeito:
A partir de António Piedade, Vénus, Marte e o som do Big Bang, Íris Científica, mar da palavra.

A tinta que falta

É uma velha piada que circulava na RDA sobre um trabalhador alemão que encontra trabalho na Sibéria. Consciente que todas as suas cartas serão lidas pelos censores, explica aos amigos: "Estabelecemos um código: se receberem uma carta escrita a tinta corrente, azul, estou a dizer a verdade; se ela estiver escrita a tinta vermelha, estou a mentir." Um mês depois, os amigos recebem a primeira carta, escrita a tinta azul: "Aqui tudo é maravilhoso, as lojas estão abastecidas, a comida é abundante, os aposentos espaçosos e bem aquecidos, as salas de cinema passam filmes ocidentais, há raparigas disponíveis - a única coisa que falta é a tinta vermelha".
A estrutura é mais complicada do que parece: mesmo não podendo indicar da forma previamente estabelecida que está a mentir, o trabalhador consegue passar a mensagem. Como? Inscrevendo a referência ao código na mensagem codificada, como um dos seus próprios elementos. É a clássica problemática da auto-referencialidade: se a carta está escrita a tinta azul, o seu conteúdo não é verdadeiro? O facto de mencionar a falta de tinta vermelha assinala que a carta deveria ter sido escrita a vermelho. O interessante é que seja essa mesma alusão a produzir o efeito de verdade, independentemente da sua própria verdade literal: mesmo que tivesse sido possível encontrar tinta vermelha, as condições específicas da censura implicavam necessariamente o recurso à mentira para conseguir transmitir a verdadeira mensagem.
Slavoj Zizek, Bem-vindo ao deserto do real, Relógio de Água.
(Slavoj Zizek é filósofo, psicanalista e cinéfilo. Investigador do Instituto de Sociologia de Liubliana, é também professor visitante na New School for Social Research, em Nova Iorque)

Manhã

A manhã acabou por chegar e com ela um estranho e lento despertar. Acordou vestido de cinza, acompanhado de pequenos e sincronizados buracos no soalho. Não se lembrava de ter adormecido, mas aquele peso na cabeça era a garantia que estava acordado.

Eles encontram-se!

encontrei um poeta no virar da estrada
e perguntei-lhe o sentido do Nada.
tonto que sou, assim de esperar
que o sujeito se fosse revelar

Universo


Para quem procura os "olhos da serpente"...

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Madrugada

A madrugada tardou em chegar, assim como o sono. Sentia-se irrequieto, incapaz de acalmar. Estava deitado em cima da cama, vestido, e fumava cigarro atrás de cigarro. Olhava fixamente para o teto, mas era incapaz de controlar a corrente de ideias e imagens que lhe afluíam à mente.

Joga, não joga...

Deus não joga aos dados com o Universo - Albert Einstein.
Deus não só joga aos dados como por vezes os atira para onde não se podem ver - Stephen Hawking.




cisnes ou patos (mas de cabeça erguida)


Estrelas

Vamos pintar as estrelas com azul de santo
para as distinguir no marasmo azul do céu;
Saber que saltitam na noite longa de breu.

Sim, vamos deixar algumas em branco
para mantermos um brilho mais claro
durante o sono que a noite torna ignaro
e assim continuarmos abertos ao espanto.

sotap uo sensic


Cristina e o fel

A Cristina destilava o fel que lhe era tão típico. “O tempo que estivemos juntos não valeu de nada”, disse ela com aquela simpatia que o álcool lhe acicatava. Na altura não fui capaz de argumentar com ela, mas hoje apenas posso concordar com o que ela disse...

O que é a consciência?

O terceiro problema da consciência, intimamente relacionado com a questão do eu, é o problema da liberdade. Se o eu é uma ficção narrativa, quem é o autor dos actos volitivos conscientes? E, mais importante do que isso, como conciliar a sensação de que somos agentes livres com as provas manifestas de que o agente tem de estar sujeito às leis (determinísticas) da física?
Keith Sutherland, O que é a consciência, Grandes Questões Científicas, Gradiva.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Fernando Pessoa



O poeta português Fernando Pessoa foi eleito uma das 50 personalidades que mais influência teve na Cultura europeia, revelou o Bureau Internacional das Capitais da Cultura. Este foi o resultado de uma votação de âmbito universitário promovida pela organização da Capital da Cultura Catalã em vários países europeus. Um total de 137.622 pessoas do continente europeu participaram neste inquérito que decorreu durante nove meses. Entre os eleitos, que se destacaram nas áreas das Humanidades, Artes e Ciências encontra-se para além Fernando Pessoa, Leonardo da Vinci, Shakespeare, Mozart, Einstein, Sócrates (o filosofo não o nosso primeiro :)), Goethe, Galileu Galilei, Carlemany, Erasme de Roterdão e Dostoievski. O presidente do Bureau Internacional de Capitais Culturais e da Organização da Capital da Cultura Catalã, Xavier Tudela, disse que «a Cultura é a essência que une os europeus. Quanto mais se conhecer o legado das pessoas que se destacaram no contributo cultural para o nosso continente mais capazes seremos de construir uma Europa mais forte e sólida».
Fonte: Sol

Como gostava de ser europeu e partilhar cultura e saber...

Porque será o tempo tão estranho?

Um dos resultados de experiências mais perturbadores na história da ciência foi o estudo feito pelo neurocientista Benjamim Libet. Ele monitorizou os impulsos cerebrais e nervosos para demonstrar que o movimento dos músculos supostamente sob controle consciente - o tamborilar de um dedo, por exemplo - é comandado por impulsos nervosos do cérebro e da espinal medula antes de termos consciência de que queremos efectuar o movimento. Isto é perturbador, uma vez que implica de forma clara que a nossa sensação de termos um controle consciente sobre as nossas acções é uma ilusão.
Michel Hanlon, 10 Perguntas às quais a ciência não sabe responder - ainda, Civilização Editora.

O que sabemos que sabemos

Digamos que uma nave espacial aterra ao seu lado e que lá dentro está o Livro Universal de Tudo. E você pode fazer uma pergunta. Qual é?
Agora, digamos que O Livro se sente subaproveitado e você tem direito a mais uma pergunta. Pense em algo sobre que tenha apenas pura curiosidade (O Elvis está vivo; onde ficaram as chaves do carro).
Agora, O Livro sente-se exausto e tornou-se o Livro Universal de Tudo, fazendo as perguntas de todos e obtendo as respostas verdadeiras.
Assim, a questão para si - para a resposta ser adicionada a O Livro - é:
Qual é a única coisa que você sabe ao certo?
William Arntz, Betsy Chasse e Mark Vicente (autores do filme What the Bleep Do We Know!?), Afinal o que sabemos nós, Sinais de Fogo.

Confissão

E aqueles que, lendo o que fica exposto, me perguntarem: - "Mas por que não fez a sua confissão quando era tempo? Por que não demonstrou a sua inocência ao tribunal?" - a esses responderei: - A minha defesa era impossível. Ninguém me acreditaria. E fora inútil fazer-me passar por um embusteiro ou por um doido… Demais, devo confessar, após os acontecimentos em que me vira envolvido nessa época, ficara tão despedaçado que a prisão se me afigurava uma coisa sorridente. Era o esquecimento, a tranquilidade, o sono. Era um fim como qualquer outro - um termo para a minha vida devastada. Toda a minha ânsia foi pois de ver o processo terminado e começar cumprindo a minha sentença.
A CONFISSÃO DE LÚCIO
MÁRIO DE SÁ-CARNEIRO

Lírio ou Rosa? - Vaidosa

Dizem que tu és pura como um lírio
E mais fria e insensível que o granito,
E que eu passo aí por favorito
Vivo louco de dor e de martírio.

Contam que tens um modo altivo e sério,
Que és muito desdenhosa e presumida,
E que o maior prazer da tua vida,
Seria acompanhar-me ao cemitério.

Chamam-te a bela imperatriz das fátuas,
A déspota, a fatal, o figurino,
E afirmam que és um molde alabastrino,
E não tens coração como as estátuas.

E narram o cruel martirológio
Dos que são teus, ó corpo sem defeito,
E julgam que é monótono o teu peito
Como o bater cadente dum relógio.

Porém eu sei que tu, que como um ópio
Me matas, me desvairas e adormeces,
És tão loura e dourada como as messes
E possuis muito amor... muito amor-próprio.

Cesário Verde, Vaidosa (1874)

terça-feira, 20 de maio de 2008


Rosa


Ainda me lembro das rosas
que deixei suavemente sobre o teu leito

Tentação



Porque me tentas se o teu objectivo é abandonar-me?

... A Few Good Men

E para os cinéfilos que, de algum modo, sempre se surpreenderam a ver o Tom Cruise - esse menino bonito dos anos oitenta -, a fazer um papel sério.

Claro que o melhor de tudo é este pedaço da interpretação de Jack Nicholson, no papel de Coronel Nathan Jessep, que lhe valeu a nomeação para o Óscar de Melhor Actor Secundário.

A Few Good Men, 1992

A Few Good Laughs vs...

Para os nostálgicos...

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Mário Sá-Carneiro

Quase...

Teus olhos espelhavam vontade de céu
Em disfarce temporário aqui em terra,
Encoberto em sons de poemas como véu
Que todo abre ao sol e abrasando ferra

Um pouco menos luz, eras humano
Um pouco menos azul, só eras Mário
Mas da vida fizeste sudário em pano
Que disfarçava o calor de teu solário

Só a quem lê faltará o golpe de asa
Pequenos ao tamanho de tanto além
Ficámos e ficamos nós aqui aquém
Só memória tem luz da grande brasa

M S-C 19.05.890

A minh'Alma fugiu pela Torre Eiffel acima,
- A verdade é esta, não nos criemos mais ilusões -
Fugiu, mas foi apanhada pela antena da T.S.F.
Que a transmitiu pelo infinito em ondas hertezianas...

(Em todo o caso que belo fim para a minha Alma!...)

MÁRIO DE SÁ-CARNEIRO (1890 - 1916)

Os Maias

Em todo o caso quando Lisboa descobriu aquela legenda de sangue e negros, o entusiasmo pela Monforte calmou. Que diabo! Juno tinha sangue de assassino, a belta do Ticiano era filha de negreiro! As senhoras, deliciando-se em vilipendiar uma mulher tão loira, tão linda e com tantas jóias, chamaram-lhe logo a negreira! Quando ela aparecia agora no teatro, D. Maria da Gama afectava esconder a face detrás do leque, porque lhe parecia ver na rapariga (sobretudo quando ela usava os seus belos rubis) o sangue das facadas que dera o papázinho! E tinham-na caluniado abominavelmente. Assim, depois de passarem em Lisboa o primeiro Inverno, os Monfortes sumiram-se: pois dissesse logo, com furor, que estavam arruinados, que a policia perseguia o velho, mil perversidade... O excelente Monforte, que sofre de reumatismos articulares, achava-se tranquilamente, ricamente, tomando as águas dos Pirinéus... Fora lá que o Melo os conhecera...
Eça de Queiroz

Gato Fedorento - Tesourinhos Deprimentes José Ladeiras

A pedido de um amigo, fã do José Ladeiras...

domingo, 18 de maio de 2008

É. É mesmo ele. De outros tempos...

Custou encontrar, mas encontrei.
Foi a referência que motivou a busca.
Os tempos estão outros...
Em edição única e limitada e,
agora, em versão não integral.
Mas é...


Não sei de que fugíamos.
.................

Seja como for, a cidade
predispunha-se, aceitava calmamente
pequenos gestos de ternura,
delírios de morte apenas.
Zé dos Ossos, Trianon - os nomes
que decorei, enquanto fugíamos
da calúnia dos vinte anos.

As tardes no jardim, um pouco lúgubres,
pronunciavam a costumeira subida:
jantávamos os dois por setecentos escudos,
mesmo ao lado da taberna que não tinha mesas.

Saía barato, o amor. Por não sabermos,
ainda, que teríamos de o pagar a vida inteira
com juros aziagos e versos de demora.

Manuel de Freitas, Rua de Montarroio

Juros de Demora, Assírio & Alvim

sábado, 17 de maio de 2008

L'occasione

- Quem és tu, que mulher mortal não és?
Com graça tanta o céu te adorna e dota!
Descansa! Porque tens asas nos pés?
- Eu sou a Ocasião que ninguém nota.
A causa deste infindo labutar
É que ando com meus pés sobre uma roda.
Voo algum, meu correr pode igualar,
Mas estas asas nos meus pés mantenho
Pra que se iluda, ao vê-las, vosso olhar.
À frente, esparsos, meus cabelos tenho;
Neles escondo o peito e o rosto belos
Pra não me conhecerem quando eu venho.
Minha cabeça atrás não tem cabelos,
Pois, evitar que os tirem, não consigo,
Os que ultrapasso e em vão tentam prendê-los.
- Dize-me: essa quem é, que vem contigo?
- A Penitência; ouve, porém, se entendes:
Quem me não prende, prende-a por castigo.
E tu, que o tempo a discursares despendes,
Todo ocupado em pensamentos vãos,
Desleixado! não vês e não compreendes
Como é que eu te fugi por entre as mãos!

Niccolò Machiavelli (1469 – 1527)
Versão de A. Herculano de Carvalho, oiro de vário tempo e lugar

adeus...


sexta-feira, 16 de maio de 2008

"Benefits supervisor sleeping"




Lucian Freud com a venda do seu quadro "Benefits supervisor sleeping", tornou-se o pintor vivo mais valioso do mundo.

dietas

Estava eu a pensar em comer uma omoleta, quando a Mariana disse: “Isto de ter ovários faz mal às pessoas.” Ainda não sei porquê, mas fiquei seriamente convencido que durante este ciclo lunar ia tentar uma dieta vegetariana…

quinta-feira, 15 de maio de 2008

O Rei dos Alnos

Com todo o respeito por postagem pretérita (16.04.2008), aí na tradução de Eugénio de Castro, acrescento a de Herculano de Carvalho do grande - enorme - poema de Johann Wolfgang Goethe.
.......................
Quem vai cavalgando em noite tão fria?
O pai com seu filho ao vento fugia.
Nos braços o tem, seu vulto acalenta,
Com força o aperta e vai na tormenta.
.....................
Meu filho, que faz teu rosto esconder?
O Rei dos Alnos, pai, não vês aparecer?
Dos Alnos, o Rei, com cauda e coroa? -
Meu filho, eu só vejo a névoa que voa.
..........................
"Menino adorado, anda, vem comigo!
Brinquedos tão lindos brincarei contigo;
Tanta flor bonita há na beira-mar,
Teus vestidos pode minha mãe dourar".
........................
Meu pai, ó meu pai, não ouves com medo
O que o rei dos Alnos promete em segredo? -
Meu filho, sossega e fica tranquilo;
Tu sentes nas folhas, do vento, o sibilo.
......................
"Queres tu, meu rapaz, comigo ir embora?
As filhas que eu tenho esperam-te agora;
É delas na noite a ronda que parte,
E dançam e cantam e vão embalar-te".
......................
Meu pai, ó meu pai, não vês tu além
As filhas do Rei dos Alnos, também? -
Meu filho, ó meu filho, eu vejo, há momentos,
Que os velhos salgueiros parecem cinzentos.
......................
"Teu rosto me agrada e sou teu amigo,
Se a bem não queres vir, sou eu que te obrigo".
Meu pai, ó meu pai, não deixes levar-me!
Dos Alnos, o Rei, já fez magoar-me!
............................
O pai assustou-se, partiu velozmente,
Nos braços levava o filho gemente;
Cansado, chegou em angústia absorto;
Mas já, nos seu braços, o filho era morto.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Só se for de noite

Acalenta-me a esperança fugidia
De te rever numa curva apertada
Àquela hora onde se perde o dia,
Onde a luz se mistura com o nada

Sei assim que os contornos não são teus
A mistura do que recordo e do que sonho
Esse que perde a noite nos fogos só meus
E deixa estrelas no escuro onde me ponho

Se vieres de luz, então tenho receio
De deslumbrar ao facho que me dás
De ficar preso na corrente do enleio
Que obriga o forte julgar-se incapaz

Transparências III

Água Castello ao entardecer.
Detalhe: os "piquinhos" de gás a subir
Também à mesa da esplanada.

Duran Duran - Save a Prayer

Ainda se lembram do início dos anos 80?


Uma carta para Garcia

O meu coração enternece-se pelo homem que realiza o seu trabalho quando o "chefe" está ausente, com o mesmo empenho que demonstra na sua presença. E pelo homem que, ao receber uma carta para entregar a Garcia, pega nela sem fazer perguntas desnecessárias e sem a intenção latente de a deitar na valeta próxima, sem pensar em outra coisa que não encontrar o destinatário. Pelo homem que nunca é "despedido" nem precisa de entrar em greve por melhores salários.
A civilização é uma busca longa e ansiosa por pessoas assim. Qualquer coisa que tal homem peça será atendida. Ele é desejado em todas as cidades e aldeias, em cada escritório, loja e fábrica. O mundo clama pela sua presença: ele é necessário, e muito, o homem que pode levar uma mensagem a Garcia - Elbert Hubbard, A message to Garcia.

Lisboa, fim de tarde




Coimbra, fim de queima




segunda-feira, 12 de maio de 2008

The Lovers



(1928)
René Magritte

Só por que posso...

Brett Anderson - Love Is Dead

Só por quero...

Lenta despedida

O Sol iniciava a sua lenta despedida, deixando no horizonte tons que marcavam o fim de mais um dia de Outono. Ela ao longe, só, encostada a uma árvore, não conseguia chorar; o que sentia era de tal forma grande e forte, que a transcendia como se consumisse a sua própria existência. Tudo o que ela era, tudo o que a rodeava não passava de borrões indefinidos, espalhados numa realidade que se confinava à própria dor.
O corpo envolto pelo castanho madeira baixava à terra. As silhuetas negras eram como pequenos recortes maculando a pouca luz que se esvanecia. Um vento suave, mas frio, varria as folhas prostradas sob o chão, encenando um pequeno e estranho bailado…

Peter Greenaway - NIGHT WATCHING

O artista plástico voltou ao cinema.

domingo, 11 de maio de 2008

Transparências I

Como não podia deixar de ser, também à mesa de uma esplanada, ainda que com inclinação.
Para a história e memória deste pequeno Digesto de amigos - convivas de boas tertúlias-, congratulo-me ao dar-me conta de que chegámos à metade do milhar, num lento e doce discorrer.

"Prateada"

A hora deixa na noite, de arrepios
A vista de meu cansaço enevoada
Procuro no vazio dos lugares vazios
A dela, minha lembrança esvaziada.

Salpico a memória com a luz de restos
Aflijo-me de não sentir um só recordo
Invento desculpas em jeito de protestos
Como a balir, e sabendo que não mordo

Afinal o esforço não me valeria de nada
Sempre assim é a quem por pouco sofre
A mulher escondeu-se em forma prateada
E anda a incomodar nos cantos do blogue

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Michael Nyman Band - Chasing Sheep is Best Left to Shepherds

Para os que nos acusam de sermos demasiado intelectuais, aqui vai a simplicidade do minimalismo...

fernando pessoa

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Prata



Em homenagem a EROS... que, por vezes, me custa estar congelado.

Longe, Perto: O Horizonte

A utopia é uma subespécie de insolência onde se refugiam os negadores de poderes. São prestidigitadores que avançam com o inédito contra a "ordem do dia" onde abrem uma ferida incurável que é a experiência do excesso. Sob o pretexto de nos proteger da fatalidade, a utopia oscila entre o apocalipse e a esperança, isto é, entre o medo e o medo de ter medo, perpetuando-nos o cativeiro mesmo se ele é, e é sempre, dissonante.
Quando o futuro se preparava para ser um exercício de repetição assente na sua legitimidade tecnológica, a utopia interrompeu-a (sécs. XIX e XX) com a sua verdade abrupta e redentora.
A utopia, é a sua função, instala a incerteza. É na incerteza que reside, ansiosa, a liberdade. Fernando Gandra, O Sossego Como Problema (peregrinatio ad loca utopica), Fenda, 2008.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

ond andaaaam oos pequeeenoos?


estás sempre a dormir...


e eu aqui perdido!


POEMA do DIA

Quem não sonhou com impossíveis
Nem fez castelos grandiosos
Sobre areias movediças?
Doces imagens que nos olhos
Ficastes pálidas e frias!

Sois como pássaros cativos
E abris em frémitos inúteis
As finas asas coloridas
Peixes no aquário translúcido
Sonhais vogar dentro dum rio.

Crianças doentes, que no quarto
Fazeis projectos de futuro.
Surdas canções de condenados…
Breve paisagem de algum quadro
Presa debaixo da moldura.

Ó flutuantes sombras tímidas,
Que receais o mundo e os homens,
Ficai em nós, mudas e moles:
Recordações indefinidas
De tudo aquilo que não fomos.

CABRAL DO NASCIMENTO
Nostalgia, 33 Poesias (1941) e Cancioneiro (1963, 1976)

(e assim passou um mês de poemas, dia a dia)

quarta-feira, 7 de maio de 2008

300


Porque a Banda Desenhada também é arte...

O Mestre e o Admirável

Pergunto-te, Mestre, se sem memória não vivemos; se o tempo em que dormimos e não recordamos os sonhos conta como vida ou é apenas instrumental.

Não conta. Se tanto, é instrumental: só se vive o que se pensa e só se pensa o que se recorda.

Então, viveremos mais ou menos, consoante os anos de pensamentos e memórias, não consoante o que chamamos vida.

É certo.

Então, se pensarmos mais depressa, vivemos mais tempo.

Não digo mais tempo, viveremos mais. O tempo atrapalha a questão. Se pensarmos ao dobro da velocidade, viveremos o dobro.

Mas o Admirável diz o contrário: se conseguirmos pensar mais devagar, o tempo torna-se pastoso, em vez de corrido.

Pastoso ou corrido não é velocidade, é profundidade. A resposta não está no tempo mas no viver. Se pensares depressa, verás que o Admirável vive menos, porque se perde no tempo.

O Mestre e o Admirável, O Sétimo Livro

Ryuichi Sakamoto - Merry Christmas Mr. Lawrence (Trio Tour)

Para além do tempo. Simplesmente maravilhoso!

Douro


Veneza, 2005


POEMA do DIA

Uma mesa de plástico, branca
junto da tarde que morre
e renasce por pequenas paixões
de repente estávamos sozinhos
as ilhas muito inacessíveis
agora que escureceu
o menor desejo teria um sentido delicado
os olhos velozes de um gato
viam coisas belas
lado a lado com os homens
pareciam quase não ter sofrido

a mesa estava encostada às janelas do café
e nós de forma desolada
ignorados, aturdidos, de passagem
não muito mais

procuro desse facto uma versão
que me conduz à inconfidência

era uma mesa lisa, branca
uma razão soletrava um acaso
a medida soberana do incerto

olhos velozes de um gato os teus
olhos

JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA
Reis Magos, Pequenas Paixões (Baldios)