segunda-feira, 30 de junho de 2008

Quer pouco: terás tudo.
Quer nada: serás livre.

Fernando Pessoa

(in complementos indirectos, Clara Pinto Correia)
Criar não é imaginação, é correr o grande risco de se ter a realidade.

Clarice Lispector

(in baldios, José Tolentino Mendonça)
Só o sol tem direito às suas manchas.

J. W. Goethe

(in uma solidão demasiado ruidosa, Bohumil Hrabal)
Para uma coisa se tornar interessante, basta olhar para ela durante algum tempo.
30062008
Gustave Flaubert
30062008
(in o rei dos álamos, Michel Tournier)

Aos campeões

Mas, enfim, só até Galicia

Espanha

Parabéns aos nossos vizinhos, que desta vez realmente mereceram... Agora que venham os Jogos Olímpicos, que este país está a ficar muito violento.

Ibiza


Coimbra


domingo, 29 de junho de 2008



The world was all before them, where to choose
Their place of rest, and Providence their guide.
They, hand in hand, with wand'ring steps and slow
Through Eden took their solitary way.
29062008
Milton, Paradise lost

(in para viver um grande amor, Vinicius de Morais)
The body contains the life story just as much as the brain

Edna O'Brien

(in the dying animal, Philip Roth)

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Enigma



Qual o número mínimo?

Uma pista: primo.

A resposta só é importante quando realmente se entende a pergunta.
"Quando ninguém me coloca a questão, eu sei; mas quando alguém ma coloca e eu quero responder, já não sei."
abcdefgh ejlm
Santo Agostinho
nopqrstu vxz
(in sobre o amor e a morte, Patrick Suskind)

quarta-feira, 25 de junho de 2008

terça-feira, 24 de junho de 2008

O Homem Lento


Elizabeth Costello regressa. Agora, imiscuindo-se na desconexa vida de Paul Rayment, um antigo fotógrafo que acaba de ter um acidente de viação e perde uma perna. A perda da perna é muito mais que isso e avança para um vasto conjunto de interrogações sobre a velhice, a sexualidade, o sentido da vida, a paternidade e do amor. O que se pode negociar? O carinho, o cuidado? Um livro deslumbrante.

“Contudo, frívolo não é uma palavra má para o resumir, tal como ele era antes do acontecimento e pode ainda ser. Se no decurso da vida não fez nada de mal, tão-pouco fez bem algum. Não deixará vestígios, nem sequer um herdeiro que perpetue o seu nome. Deslizar pelo mundo: era assim, em tempos idos, que se costumava designar vidas como a sua (…) Porquê? Porque razão pode a imagem fragmentária de uma mulher ser admirada, mas não a imagem de uma mulher fragmentária, por mais cosidos que os cotos estejam? (…) Será que as relações com o belo nos elevam, nos fazem melhores pessoas, ou será abraçando os doentes, os mutilados, os repulsivos, que nos aperfeiçoamos? (…) – Claro que pode amar quem quiser. Mas talvez doravante deva guardar o seu amor para si, como uma pessoa guarda uma constipação ou um ataque de herpes para si, por uma questão de consideração pelos vizinhos”

segunda-feira, 23 de junho de 2008

magma

Dizem que é a melhor Revista dos Açores. E os Açores, sem prejuízo de outras grandezas, são enormes na poesia e na literatura.


Com periodicidade semestral e coordenação específica e ponderada para cada número, Magma é propriedade da Câmara Municipal das Lajes do Pico; acompanha-se sempre de interessantes separatas e tem uma tiragem de algumas centenas de exemplares.

É linda, tal como aquela Ilha Montanha.

Amanhã, depois da conselheira noite

Quando as gaivotas traçam o céu
Céu azul cinzento, de tarde finda
Imaginava-te eu, antes desse véu
Que esconde mais saudade, ainda

Tinha receio d’escancarar a descoberta
Que o pudico é outro nome de enlevos
Se da sonolência nossa, algum desperta
Deixamos de saber encobrir os medos.

Assim, deixo que as gaivotas dissipem,
Que a noite chegue, eterna conselheira
A consolar os fantasmas que a habitem
No ar melado da surrealista cavaqueira

Amanhã, o Sol vem estalar o tempo
O calor suará dos corpos fatigados;
Voltamos a esperar a noite, advento
Dos amores, repetidos de cansados.

domingo, 22 de junho de 2008

Verão singular

Francisca perguntou se chegara o Verão.
Trazia longas tranças nos cabelos espiga
Eu olhei-a, lento a sair-me da distracção
De um poema; mas ela era minha amiga

E disse-lhe a verdade: não reparei
O tempo vinha triste, descontente
Como saíra, também logo eu entrei
E não atentei em nada de diferente

- Mas olha que sim, sinto-o no corpo
Teimou, deitando olhos de azul vivo
- Se assim, Xisca, conclui-lhe absorto
Nem virá; afinal preferiu ficar contigo.

sábado, 21 de junho de 2008

Parabéns

Parabéns ao Agosto que anuncia um Maio carregado de Letras!

Machado de Assis



Poeta, dramaturgo, romancista (Dom Casmurro, Quincas Borba, Memórias Póstumas de Brás Cubas...) Joaquim Maria Machado de Assis nasceu no Rio de Janeiro em 21 de Junho de 1839.

Sartre



Os séculos são de toda a gente. Seja no Ser, seja no Nada. Mas, porque nascido a 21 de Junho (de 1905) fica aqui a lembrança e a memória.

Aniversário

Disseram que fazias anos?
Só por ser chegado o dia?
- Deixa-te dessa fantasia:
Não passa tudo de enganos

Se um homem é um dia inteiro
Ou um segundo, ou um acaso,
Porque será que, lá pelo meio
Se resolvem a dar-lhe prazo?!

Não faço; não faço e pronto
E, de todo o modo, está feito
Não, em vez de me pôr a jeito
Vou é reclamar um desconto.

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Aos que não perdem. Porque nunca se perdem.

Ao que nunca se sente derrotado. Mesmo que a memória lhe diga. Haver uma maneira antiga. De assim contar o acaso.


Aos que ficam de pé. Que têm essa ousadia. Que, mais que um rasgo de fé. É um jeito de ser, é teimosia.

Às vezes, a vitória é um pormenor
Mas, mesmo assim... qual é o mal?
Quando a vista de fundo for melhor
A derradeira vitória é PORTUGAL.
Dia de lavar a vista nas águas do mar
De saltar das nuvens e... esperar.

Assim foi...

E assim foi... A Alemanha jogou melhor e ganhou. Mas valeu a pena, como sempre.
De qualquer modo, ser Português é saber sofrer e saber chorar, seja de Alegria ou de Tristeza.
Seremos sempre assim e isso ninguém nos tira.
Viva Portugal! Hoje e Sempre!

Chico Buarque - O que será

Parabéns!, atrasados, mas enfim...

quinta-feira, 19 de junho de 2008

realidade


Somos todos bem-vindos de volta à realidade. Agora sim, está na hora de fazer Portugal... Amigo Viriato, por favor, começa por aqui... ;)

Será?

Nós sabíamos, Ricardo... mas o Luíz esqueceu!

quarta-feira, 18 de junho de 2008

A todos e aos juristas

Com dedicatória aos juristas e aos escritores, mas especialmente aos leitores, sendo ou não sendo, assumindo ou não alguma das indicadas definições, aqui largo números antigos (mas actuais) desta Revista que teima e insiste. Com prosa, poesia e muita oportunidade.

É a Foro das Letras, editada pela Associação Portuguesa de Escritores-Juristas - Coimbra.

iluminas os dias escuros, no longe das vagas.
e as águas reflectem-se de vontades paradas;
aguardam ocasiões novas de caminho aberto,
debaixo desse imenso céu, azul mas tão certo.

na "ordem do dia"...


Em tempo...


A Revista EGOÍSTA acaba de publicar um número especial, inteiramente dedicado a Fernando António Nogueira Pessoa (13.Junho.1888 / 30.Novembro.1935) com a colaboração de vários especialistas (Zenith, Tabucchi, Blaufuks, Teresa Rita Lopes, Inês Pedrosa…) e um poema de Nuno Júdice na contracapa.

Cariates


De perder a cabeça...

terça-feira, 17 de junho de 2008

Fábula



António Franco Alexandre nasceu em Viseu a 17 de Junho de 1944. Matemático e filósofo, é tido como um dos melhores poetas da actualidade. Inovador.


Nesta última tarde em que respiro / A justa luz que nasce das palavras / E no largo horizonte se dissipa / Quantos segredos únicos, precisos, / na ausência interminável do teu rosto. / Pois não posso dizer sequer que te amei nunca /Senão em cada gesto e pensamento / E dentro destes vagos vãos poemas; / E já todos me ensinam em linguagem simples / Que somos mera fábula, obscuramente / Inventada na rima de um qualquer / Cantor sem voz batendo no teclado; / Desta falta de tempo, sorte, e jeito / Se faz noutro futuro o nosso encontro.

Uma fábula, Assírio & Alvim


Baloiçar os olhares

Tenho saudades daquele tempo
Em que corrias atrás de… nada
A cabeça a beber o som do vento
E o mundo ali parado; e tu parada

Pois não eram precisos passos
Nem força, suor, ou a correria
Nossos olhos eram os espaços
De se sonhar o voar da fantasia

Passávamos as tardes no baloiço
Só a balançar os olhares risonhos.
Hoje, a cada acordar, ainda o oiço:
Dizias ser só isso o rir dos sonhos.

verdes eram os campos e as saudades...



segunda-feira, 16 de junho de 2008

Kafka


Als Gregor Samsa eines Morgens aus unruhigen Träumen erwachte, fand er sich in seinem Bett zu einem ungeheueren Ungeziefer verwandelt. Er lag auf seinem panzerartig harten Rücken und sah, wenn er den Kopf ein wenig hob, seinen gewölbten, braunen, von bogenförmigen Versteifungen geteilten Bauch, auf dessen Höhe sich die Bettdecke, zum gänzlichen Niedergleiten bereit, kaum noch erhalten konnte. Seine vielen, im Vergleich zu seinem sonstigen Umfang kläglich dünnen Beine flimmerten ihm hilflos vor den Augen.
»Was ist mit mir geschehen?«, dachte er. Es war kein Traum. Sein Zimmer, ein richtiges, nur etwas zu kleines Menschenzimmer, lag ruhig zwischen den vier wohlbekannten Wänden. Über dem Tisch, auf dem eine auseinandergepackte Musterkollektion von Tuchwaren ausgebreitet war - Samsa war Reisender - hing das Bild, das er vor kurzem aus einer illustrierten Zeitschrift ausgeschnitten und in einem hübschen, vergoldeten Rahmen untergebracht hatte. Es stellte eine Dame dar, die mit einem Pelzhut und einer Pelzboa versehen, aufrecht dasaß und einen schweren Pelzmuff, in dem ihr ganzer Unterarm verschwunden war, dem Beschauer entgegenhob.
Gregors Blick richtete sich dann zum Fenster, und das trübe Wetter - man hörte Regentropfen auf das Fensterblech aufschlagen - machte ihn ganz melancholisch. »Wie wäre es, wenn ich noch ein wenig weiterschliefe und alle Narrheiten vergäße«, dachte er, aber das war gänzlich undurchführbar, denn er war gewöhnt, auf der rechten Seite zu schlafen, konnte sich aber in seinem gegenwärtigen Zustand nicht in diese Lage bringen. Mit welcher Kraft er sich auch auf die rechte Seite warf, immer wieder schaukelte er in die Rückenlage zurück. Er versuchte es wohl hundertmal, schloß die Augen, um die zappelnden Beine nicht sehen zu müssen, und ließ erst ab, als er in der Seite einen noch nie gefühlten, leichten, dumpfen Schmerz zu fühlen begann.


Die Verwandlung

Franz Kafka

Um dia normal

No dia 16 de Junho de 1904, o professor Stephen Dedalus conversa com o amigo Buck Mulligan, dá uma aula e passeia no rio. Leopold Bloom, preocupado com a eventual traição de Molly, sua mulher, recebe uma carta de amor, vai a um funeral, lancha e visita um editor. Dedalus discute Shakespeare e encontra-se com Bloom. Passam por um bordel e Leopold acaba deitado ao lado de Molly.

Ironia, enigma, jogo de palavras, sexo (publicado em 1922, foi proibido nos EUA até 1933 por ser "pornográfico") e o famoso monólogo interior... tudo correndo em ligação de fundo à Odisseia, e durante as dezoito horas daquele dia 16 de Junho.

Ulisses - James Augustine Aloysius Joyce (2.02.1882 - 13.01.1941)

Bloomsday


Parecia ser um dia "vulgar", salvo para James e Nora. Mas acabou por vir a ser um dia imortal.
Com efeito...

Tudo, mas mesmo tudo...

Tudo - que foi imenso - se passou naquele enorme e grandioso dia 16.

16 de Junho de 1904.

Gondelim


Constava do Grande Livro, guardado na Catedral de Godelim, que um guerreiro louco, descido do Norte, matara o urso que rondava aquele alto de pedregulhos, proclamando-se soberano das terras a perder de vista. Mas, a partir daí, só fêmeas se sentariam no trono, cabendo a precedência à que fosse de mais espessa barba, dentre as filhas da monarca reinante.

O reino de Godelim era povoado por gentes que trabalhavam de sol a sol, sachando os campos produtores de trigo e cevada, artigos com que atulhavam os celeiros reais. As rainhas governavam os seus súbditos, com grande tirania, cobrando impostos pesadíssimos, por cada alqueire de cereal que tirassem para seu próprio sustento, e obrigando-os a contribuir, com porcos da sua criação, para o apetite imenso de que padeciam.

Mário Cláudio, com ilustrações de Albuquerque Mendes
Edições Quasi

sábado, 14 de junho de 2008

Aniversário4

Jörg Immendorff nascido a 14 de Junho de 1945, Bleckede, tendo falecido em 28 de Maio de 2007 em Düsseldorf, foi um dos maiores pintores contemporâneos alemães, além de escultor, cenógrafo e professor de arte.
As suas pinturas são de alguma forma remanescentes do surrealismo, e quase sempre com um forte simbolismo para transmitir suas ideias políticas. Foi membro do movimento de arte alemão chamado Neue Wilde (Novos Selvagens). A sua série mais famosa “Cafe Deutschland”, composta de dezasseis grandes pinturas teve início em 1977. Nela, Immendorff utiliza frequentadores de discoteca para simbolizar o conflito entre as Alemanhas Oriental e Ocidental.

Ao amigo JE; sempre atento...

Aniversário3


Ernesto Guevara de la Serna, mais conhecido por Che Guevara ou El Che, nascido, na Argentina, a 14 de Junho de 1928 — e assassinado na Bolívia a 9 de Outubro de 1967, foi um dos mais famosos revolucionários comunistas da história. Foi considerado pela revista norte-americana “Time Magazine” umas das cem personalidades mais importantes do século XX.

Parabéns

Criado por Joe Shuster e Jerry Siegel, Superman (ou Super-Homem), um dos mais famosos personagens de Banda Desenhada e da da cultura pop ocidental, surgiu na revista Action Comics n.º 1, em14 de Junho de 1938 nos Estados Unidos.
Hoje é publicado pela editora DC Comics, uma empresa subsidiária do grupo Time Warner.

Superman nasceu no fictício planeta Krypton e foi chamado pelos seus pais Kal-El (que significaria Filho das Estrelas no idioma kryptoniano). Foi mandado para a Terra por Jor-El, seu pai, cientista, momentos antes do planeta explodir. O foguete aterrou na Terra, na cidade de Smallville, onde, ainda bebé, foi descoberto pelo casal de fazendeiros Jonathan e Martha Kent, que o adoptaram e com quem viveu até à idade adulta. Conforme foi crescendo, ele descobriu que tinha poderes diferentes dos humanos normais. Quando não está a lutar contra o mal, ele vive como Clark Kent, trabalha como repórter no Jornal “Daily Planet” e vive com Lois Lane, com quem hoje é casado.
Ora esta, ora esta... quem é que diria?...

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Aniversário 2

Nascido a 13 de Junho de 1947 em Valência (Espanha), ANTONIO SEGURA é um dos grandes guionistas espanhóis de Banda Desenhada. É autor de séries como HOMBRE, BOGEY, KRAKEN, BURTON & CYB o EVA MEDUSA, na actualidade trabalha para o mercado italiano colaborando na saga do mais carismático dos personagens do “fumetti” italiano, TEX (imagem).

Ao Amigo JE sem o qual não teria recordado estes aniversários.

Aniversário

Maria Helena Vieira da Silva, uma das figuras maiores da pintura portuguesa, nasceu em Lisboa a 13 de Junho de 1908 e faleceu em Paris a 6 de Março de 1992. Em 1928 vai viver para Paris, acompanhada pela Mãe. Começa a estudar pintura com Dufresne, Waroquier e Friez, participando numa exposição no Salon de Paris. Conhece o pintor húngaro Arpad Szenes, com quem casa em 1930.

Por que vivo...

Por que vivo, quem sou, o que sou, quem me leva?
Que serei para a morte? Para a vida o que sou?
A morte no mundo é a treva na treva.
Nada posso. Choro, gemo, cerro os olhos e vou.

Cerca-me o mistério, a ilusão e a descrença
Da possibilidade de ser tudo real.
Ó meu pavor de ser, nada há que te vença!
A vida como a morte é tudo o mesmo Mal!

Vicente Guedes, 1910

A um plagiário

Copiaste? Fizeste bem.
Copia mais, sem canseira,
Copia, pilha, retém.
É a única maneira
De não escreveres asneira.

Joaquim Moura Costa, 1909

EU

Sou louco, e tenho por memória
Uma longínqua e infiel lembrança
De qualquer dita transitória
Que sonhei ter quando criança.

Depois, maligna trajectória
Do meu destino sem esp'rança,
Perdi, na névoa ou noite inglória,
O sonho e o arco da aliança.

Só guardo como um anel pobre
Que o tê-lo herdado só faz rico,
Um fim perdido que me cobre

Como um céu dossel de mendigo,
Na curva inútil em que fico
Da estrada certa que não sigo.

Dinis da Silva, 1923

Quando olho para mim...

Quando olho para mim não me percebo.
Tenho tanto a mania de sentir
Que me extravio às vezes ao sair
Das próprias sensações que eu recebo.

O ar que respiro, este licor que bebo
Pertencem ao meu modo de existir,
E eu nunca sei como hei-de concluir
As sensações que a meu pesar concebo.

Nem nunca, propriamente, reparei
Se na verdade sinto o que sinto. Eu
Serei tal qual pareço em mim? serei

Tal qual me julgo verdadeiramente?
Mesmo ante as sensações sou um pouco ateu,
Nem sei bem se sou eu quem em mim sente.

Álvaro de Campos, 1913

Definição

Se quiserem que eu tenha um misticismo, está bem, tenho-o.
Sou místico, mas só com o corpo.
A minha alma é simples e não pensa.

O meu misticismo é não querer saber.
É viver e não pensar nisso.

Não sei o que é a natureza: canto-a.
Vivo no cimo de um outeiro
Numa casa caiada e sozinha,
E essa é a minha definição.

Alberto Caeiro

Meu coração...

Meu coração é um almirante louco

que abandonou a profissão do mar

e que vai relembrando pouco a pouco

em casa a passear, a passear...

Alchemical Rose



When we left the train we still, I found, some way to go, and set out, buttoning our coats about us, for the wind was bitter and violent. Michael Robartes was silent, seeming anxious to leave me to my thoughts; and as we walked between the sea and the rocky side of a great promontory, I realized with a new perfection what a shock had been given to all my habits of thought and of feelings, if indeed some mysterious change had not taken place in the substance of my mind, for the grey waves, plumed with scudding foam, had grown part of a teeming, fantastic inner life, and when Michael Robartes pointed to a square ancient-looking house, with a much smaller and newer building under its lee, set out on the very end of a dilapidated and almost deserted pier, and said it was the temple of the Alchemical Rose, I was possessed with the phantasy that the sea, which kept covering it with showers of white foam, was claiming it as part of some indefinite and passionate life, which had begun to war upon our orderly and careful days, and was about to plunge the world into a night as obscure as that which followed the downfall of the classical world. One part of my mind mocked this phantastic terror, but the other, the part that still lay half plunged in vision, listened to the clash of unknown armies, and shuddered at unimaginable fanaticisms, that hung in those grey leaping waves. W. B. YEATS, Alchemical Rose

Desassossego IV

Deus criou-me para criança, e deixou-me sempre criança. Mas porque deixou que a Vida me batesse e me tirasse os brinquedos, e me deixasse só no recreio, amarrotando com mãos tão fracas o bibe azul sujo de lágrimas compridas? Se eu não podia viver senão acarinhado, porque deitaram fora o meu carinho? Ah, cada vez que vejo nas ruas uma criança a chorar, uma criança exilada dos outros, dói-me mais que a tristeza da criança o horror desprevenido do meu coração exausto. Doo-me com toda a estatura da vida sentida, e são minhas as mãos que torcem o canto do bibe, são minhas as bocas tortas das lágrimas verdadeiras, é minha a fraqueza, é minha a solidão, e os risos da visa adulta que passa usam-me como luzes de fósforos riscados no estofo sensível do meu coração.

Bernardo Soares

Fernado Pessoa


Para o amigo AM que se "queixou" que todas as imagens de Pessoa o retratam como velho, aqui está um retrato com 6 anos.