sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Puro Vintage V

Com ar pensativo, estática junto aos lábios a bica que segurava entre o polegar e o indicador esquerdos, Óscar tentava tomar uma decisão.
Quem lhe dera que todos os jogos fossem "derbies" ou, pelo menos, entre equipas mais conhecidas. A Segunda Divisão B ou até certos desafios da UEFA não eram muito com ele. De qualquer modo, era sempre o mesmo... Um, xis ou dois? A dúvida que se impunha.

"Belenenses - Vitória de Setúbal"... A escolha era complicada e Óscar não pretendia arriscar o seu dinheiro, previamente contado, numa "dupla", temendo que lhe viesse a faltar para poder apôr a mesma combinação num qualquer outro recontro ainda mais imprevisível. Até porque "A Bola" tinha vindo a dar preferência, nas suas edições semanais, aos bravos do Restelo, que, por esses dias, iam aproveitando o entusiasmo proporcionado pela goleada conseguida sobre o Sporting. Talvez "1" fosse a escolha mais acertada.

No "Boavista -Benfica", a cruzinha feita com a esferográfica era mecânica e tão natural como o gole que Óscar acabava de dar no seu café, pousando a chávena logo de seguida, em jeito de desembaraço. A quadrícula do símbolo "2", devidamente assinalada. De aquilinos gostos e paixões, Óscar tinha sempre fé... Fosse qual fosse o rival do seu Glorioso, o triunfo deste, pelo menos na sua vontade - umas vezes clinicamente certeira, outras apenas clubisticamente convicta - já estava garantido.

"Porto - Vitória de Guimarães"... Para mau grado seu, os rapazes do Pedroto andavam a dar cartas. Mas o Vitória também tinha surpreendido tudo e todos há duas jornadas atrás com uma reviravolta estonteante, num jogo a contar para a Taça. O miúdo que lá tinham agora no meio campo havia de ir longe. Pelo menos era o que diziam. Deste modo, para este duelo nortenho Óscar ia cometer um pequeno desvario, apostando uma "tripla". Em qualquer dos cenários ganharia. Enfim... O campeonato estava renhido este ano. Que mais se podia fazer?

Completando o resto das quadrículas, consoante a sua acutilante intuição de "treinador de bancada", comportando em si toda uma certa ciência e saber, Óscar conservava um semblante prazeroso. Nunca se sabia... Podia ser desta vez que o seu gosto pelo "esférico rolando sobre a erva" lhe trouxesse uma alegria que realmente pesasse na carteira, em seu proveito.

Num gesto decidido, circunspecto - de acordo com a solenidade exigida para o momento -, Óscar levantava-se da sua mesa habitual na Cervejaria "Marquês", acenava ao Sr. Gomes - proprietário - e acorria ao balcão para pagar a despesa e "meter" o seu Totobola. O tempo, agora, já não era para dúvidas, mas para acreditar, mesmo que a medo miudinho. Depois logo se veria... No Domingo, junto à telefonia, talvez quem viesse a marcar o Golo d'Ouro fosse ele!

4 comentários:

AugustoMaio disse...

O texto está maravilhoso, mas o boletim revela - sei lá se assim é... - um propósito subliminar, caro Viriato: o Benfica - Tirana foi uma noite em cheio e terminou em quatro secos!

Anónimo disse...

Então certamente que o símbolo só poderia ser "1", Amigo Augusto! E sem duplas ou triplas, sequer. Como diria Gabriel Alves, "futebol de primeira água".

Foi bem escolhida a imagem, não foi?

Penhoradamente grato pelo elogio!

Anónimo disse...

É que...a ficção, embora tenha muitos poderes, não tem plenos poderes.

Anónimo disse...

Que digam todos os aqueles lá para os lados do Palácio da Justiça de Matosinhos ou Gondomar, já não sei bem. É novela que nem me interessa muito.