domingo, 6 de abril de 2008

Pastelaria Catita.6

E prosseguiu, aprimorando uma letrinha legível, desenhada no que o excesso de carinho pode olvidar a saudade:
As palavras para reflectirem a imagem da minha funda tristeza não são minhas. Com efeito, não tenho palavras. E – peço-lhe, como recompensa ao respeito – que não tome estas palavras como um jogo delas mesmas. É sentido que elas de todo me falecem. Que seria capaz de inventar para lhe entregar em ditos um tão imenso padecimento de alma? Não sou poeta, menina Rosarinha. E que fosse! Que arte de fingimento poderia criar para mentir a verdade do que sinto? É que a verdade, a menina sabe, nunca seria bastante. Rasguei-me de todos os encargos psicológicos a que a vida me acorrentou para poder resplandecer no seu olhar uma vida nova. A menina Rosarinha assumiu um compromisso que tomei por eterno; e, sabendo embora que tudo o é apenas enquanto dura, como do amor dizem os sabedores, o nosso caso quedou-se antes do nascimento, mera promessa, dolorosa ilusão.
Calisto acendeu a telefonia, à espera de um intervalo musical que lhe recompusesse as ideias.

4 comentários:

Anónimo disse...

" As nuvens avolumam-se por cima do claustro e a noite pouco a pouco encobre as lajes onde está inscrita a moral com que se dota aqueles que morreram. Se eu escrevesse aqui um livro de moral, teria cem páginas e noventa e nove estariam em branco. Na última, escreveria: "Eu apenas conheço um único dever, que é o de amar." E quanto ao resto, digo não. Digo não com todas as minhas forças. As lajes dizem-me que é inútil e que a vida é como "col sol levante, col sol cadente". Mas não vejo o que a inutilidade retira à minha revolta e sinto muito bem o que a faz aumentar. "

Camus
E – peço-lhe, como recompensa ao respeito – que não tome estas palavras como um jogo delas mesmas"..
"...

Anónimo disse...

"O amor romântico é como um traje, que, como não é eterno, dura tanto quanto dura; e, em breve, sob a veste do ideal que formámos, que se esfacela, surge o corpo real da pessoa humana, em que o vestimos. O amor romântico, portanto, é um caminho de desilusão. Só o não é quando a desilusão, aceite desde o príncipio, decide variar de ideal constantemente, tecer
constantemente, nas oficinas da alma, novos trajes, com que constantemente se renove o aspecto da criatura, por eles vestida."

Bernardo Soares

"Que arte de fingimento poderia criar para mentir a verdade do que sinto?".
A arte nunca seria bastante!

Anónimo disse...

Cá eu, acho que o senhor Calisto precisa de ser mais activo. Parecem dois envergonhados, muito metidos para dentro.
Aguardo os desenvolvimentos.

Anónimo disse...

Tem graça que também fico a aguardar...depois de tanto estardalhaço!