sábado, 7 de novembro de 2009

Bendito Novembro

"Vieram ao mundo no mesmo ano, 1919. Separados, apenas, por quatro dias: ele, Jorge Cândido de Sena, nasceu a 2 de Novembro em Lisboa; ela Sophia (de Mello Breyner Andresen), mas para todos nós apenas Sophia, a 6 do mesmo mês, no Porto. Não há que ter medo das palavras: os dois são gigantes da poesia portuguesa do século XX.
Quis o destino, o acaso, o milagre - chamem-lhe o que quiserem... - que os seus espólios tivessem entrado, também por uma pequena diferença de dias, na Biblioteca Nacional de Portugal (BN). Ambos estão no expurgo, uma câmara especificamente destinada a desinfectar e matar toda a bicharada que corrói os documentos dos espólios dos poetas, escritores e ensaístas que eles ou a família por eles doam à BN.
O primeiro a escrever foi ele: a rosa para Sophia, de Jorge de Sena, apareceu em Peregrinatio ad Loca Infecta, em 1969. O título? «A Sophia de Mello Braeyner Andressen Enviando-lhe Um Exemplar de Pedra Filosofal».
hhhhhhhhhhhh
«Filho e versos, como os dás ao mundo?
Como na praia te conversam sombras de corais?
Como de angústia anoitecer profundo?
Como quem se reparte?
Como quem pode matar-te?
Ou como quem a ti não volta mais?
(15/12/1950)
hhhhhhhhhhhhhhhhh
O cravo para Jorge de Sena aparece em Ilhas (1989), já depois de o poeta ter morrido. Intitulado «Carta(s) para Jorge de Sena», é bem mais longo.
jjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjjj
«(...)
Não és navegador mas emigrante
Legítimo português de novecentos
Levaste contigo os teus e levaste
Sonhos fúrias trabalhos e saudade;
Moraste dia por dia a tua ausência
No mais profundo fundo das profundas
Cavernas altas onde o estar se esconde
hhhhhhhhhhhh
II
E agora chega a notícia que morreste
E algo se desloca em nosssa vida
jjjjjjjjjjjj
III
Há muito estavas longe
Mas vinham cartas poemas e notícias
E pensávamos que sempre voltarias
Enquanto amigos teus aqui te esperassem -
E assim às vezes chegavas da terra estrangeira
Não como filho mpródigo mas como irmão prudente
E ríamos e falávamos em redor da mesa
E tiniam talhares louças e vidros
Como se tudo na chegada se alegrasse
Trazias contigo um certo ar de capitão de tempestades
- Grandioso vencedor e tão margo vencido -
E havia avidez azáfama e pressa
No desejo de suprir anos de distância em horas de conversa
E havia uma veemente emoção em tua grande amizade
E em redor da mesa celebrávamos a festa
Do instante que brilhava entre frutos e rostos
jjjjjjjjjjjjjj
IV
E agora chega a notícia que morreste
A morte vem como nenhuma carta»"
mmmmmmmmmmmmmm
Carlos Câmara Leme, Sophia e Jorge fariam 90 anos neste mês
Revista LER, Livros & Leitores, Novembro 2009

1 comentário:

DI disse...

São estes e outros Gigantes que, teimosamente, se impõem contra a corrente da maré e que tornam, ainda, a Lusitânia the best...