sexta-feira, 3 de julho de 2009

Sophia de Mello Breyner Andresen




Retrato de uma princesa desconhecida

Para que ela tivesse um pescoço tão fino
Para que os seus pulsos tivessem um quebrar de caule
Para que os seus olhos fossem tão frontais e limpos
Para que a sua espinha fosse tão direita
E ela usasse a cabeça tão erguida
Com uma tão simples claridade sobre a testa
Foram necessárias sucessivas gerações de escravos
De corpo dobrado e grossas mãos pacientes
Servindo sucessivas gerações de príncipes
Ainda um pouco toscos e grosseiros
Ávidos cruéis e fraudulentos
Foi um imenso desperdiçar de gente
Para que ela fosse aquela perfeição
Solitária exilada sem destino
Apesar do atraso, a nossa homenagem!

1 comentário:

AugustoMaio disse...

Eu não sou a que aparece
Eu sou a que me inventei

Sou sem ninguém
Ébria de escrita
Vou renascer do meu fim

Inclina-te a mim
Tenho asas

ASAS, Ana Hatherly, (homenagem) A Sophia, ed. Caminho




Lá onde o mar compõe
suas crinas de anémonas
e corais, recolho
o ouro da tua
palavra. É talvez
um búzio - este,
de Cós, onde agora
como nessa longa
vasta praia atlântica
de que falas ouço,
não o marulho
das águas sublevadas, mas
a tua voz coando
na ampulheta do tempo
a areia do silêncio.

Albano martins, O Búzio de Sophia,
(homenagem) A Sophia