quinta-feira, 11 de junho de 2009

Momentos

«O silêncio reinava no quarto... a dourada penumbra daquela tórrida tarde entrando pelas frinchas das portadas de madeira que permaneciam encostadas.
Luísa sentia-se serena... A primeira vez desde há muito. João dormia, a seu lado, virado para ela. Deliciada, ria-se pelo jeito de miúdo com que ele parecia sonhar. De facto, era em alturas como esta que todos os medos, que todos os receios e barreiras, as mesmas de sempre, se desmoronavam, acometendo-lhe o incauto desejo de se entregar àquele homem que tudo lhe prometia... Mas entre prometer e cumprir, haveria sempre aquele limiar intransponível de uma vida quotidiana que trazia consigo o sabor amargo de uma normalidade incontestada. Talvez, para eles estivesse reservado apenas o melhor, que, por ser único, seria sempre raro ou esparso, ainda precioso.
Ao olhar para os seus ombros descobertos, Luísa dava-se conta das marcas da conquista que deixava em João, por cada reencontro... congratulava-se por não se limitar a meros beijos, indo sempre mais fundo, lançando o seu feitiço sobre João.
"Sei que não te tenho, mas promete-me que não te perderás de mim"- disse Luísa num rouco murmúrio.
Sem abrir os olhos, João respondeu-lhe: "Tu nunca me perderás". Logo no instante seguinte, Luísa soube que acreditava em João. Que confiaria nele.
Seriam sempre um do outro...
Fosse de que maneira fosse.»
«Momentos», Alexandre Villas-Diogo

2 comentários:

Luísa disse...

Parece que quando não se tem nada, não se perdesse muita coisa...

Mariana Costa disse...

que lindo isso