quarta-feira, 16 de julho de 2008

Da Ordem ou Interrogações III

A propósito desta carta, deixo aqui um comentário que me pareceu apropriado e se revela como a resposta serena de alguém que já não consegue ficar calado durante muito mais tempo:


"Causídico
Após a leitura atenta de todos estes comentários, apenas me arrisco a dar um testemunho pessoal, porque sempre aprendi a falar apenas daquilo que conheço. Fiz o Estágio de dois anos, com o melhor patrono que poderia ter tido, que me deu trabalho, me inspirou e orientou. Nunca me tratou com paternalismo ou demasiada supervisão, assim que viu a qualidade do meu trabalho - aquela que eu procurava em cada noite de directa, com muito mais prazer do que a estudar para os exames, a preparar, às vezes duas alegações de recurso para processos distintos. Uma das coisas de que mais me orgulho é ainda hoje o meu Ilustre Patrono (agora ex) dizer que pouco ou nada me corrigia, dado o meu zelo e perfeccionismo. Enquanto exerci aquele patrocínio, estatutariamente limitado, que o estágio me impunha por forma a completar os créditos que me levariam a estar apto para exame, dos casos que tive, cinco ao todo (a comarca é densamente povoada de muitos que ficarão agora a olhar para as paredes ou a jogar solitário no portátil), três deles consegui a absolvição para o meu constituinte e dois culminaram na desistência de queixa e em acordo. Eu compreendo que, para muitos, tal caso é uma excepção, não podendo de maneira nenhuma fazer jus para a defesa de uma certa regra diferente daquela que, precisamente, insistem que existe. Contudo, sempre me pergunto: acaso não estarão agora a pôr "a carroça à frente dos bois"? É que é precisamente neste arredamento de quem ainda está a aprender - sem, contudo, ser nenhum garoto da escola primária inconsciente por estádio cognitivo - que se instila a insegurança e se acaba por dar razão ao que, espanto, se começou por dizer. Com uma agravante: um estagiário que faça o exame a uma terça e à segunda ainda é uma sub-species, à quarta já é advogado e é colocado como oficioso na barra - suponhamos. Se passou todo o estágio embrulhado em livros e em consultazinhas, que segurança tem para logo ali, à quarta-feira, poder advogar? Nunca viu nada, nunca soube nada. Há aqui, quer-me parecer, uma ideia um pouco bacoca mas tão típica deste país: O canudo dá tudo! Como se fosse por osmose. É o mesmo que ter alguém que nunca percebeu de arte ou outra coisa qualquer, de repente ser investido em umas quaisquer vestes e ter o milagre da sabedoria, por força do que sempre contemplou. Para as más-defesas haverá sempre a possibilidade de queixa aos Conselhos de Deontologia. E mesmo do lado dos cidadãos, a igual possibilidade de recusarem o advogado que lhes for facultado. A questão é que também todos nós temos de estar informados sobre tais direitos. Perdesse o Senhor Bastonário algum tempo nesse trabalho e talvez não tivesse havido tanta polémica. Por fim uma última interrogação: Se mantivermos arredados os noviços de todas as iniciações, de todos os ensinamentos práticos, que raio de Ordem queremos para o futuro? Acaso pensa alguém que seremos sempre nós a existir e a por, lá está, ordem? É que ninguém é "gerado e não criado". E mesmo o Senhor Bastonário também se fez Advogado, como todos nós. De certo me espantaria se viesse agora dizer que já tinha nascido assim. Se calhar com Toga e tudo. Num país de milagres e aparições..."

7 comentários:

Passiflora Maré disse...

Olhe Viriato, isto está uma autêntica marmelada, quando ela está no tacho a ferver e a saltar como lava.
Já ontem li o seu comntário, a carta e os comentários no Catedral Square e a coisa está mais feia do que eu pensava!!!

Anónimo disse...

Passiflora, como eu gosto é de Pêssegos no Verão, sempre digo que isto o que vai parecendo é uma grandessíssima pessegada!

Anónimo disse...

Como nas outras escolhas da vida, o eleito é sempre auqele que os eleitores merecem.

Anónimo disse...

Eu não elegi ninguém. O descalabro deu-se nos meus últimos dias de neófito a prestar provas.

Anónimo disse...

Eu também me demito de responsabilidades assumidas pelos orgãos eleitos deste nosso país: porque não votei neste Governo e não votei neste Presidente.

Anónimo disse...

Entõ,só há uma solução..."Obviamente,demitam-se todos!"

Anónimo disse...

Só valem a pena tais considerações desconstrutivistas se for para dizer alguma coisa de útil, que ainda não vislumbrei. Que é certo ter havido uma eleição isso ninguém discute e todos aceitam. A questão é que a legitimidade também se põe em causa no modo como se exerce o cargo. E, para fiscalizar tal exercício, que se quer íntegro e, no mínimo intelectualmente honesto, não há cá qualquer tipo de contra-argumentação que advenha de um aforismo, assim tornado bacoco, de que os eleitores têm o que merecem. Porque ninguém adivinha os modos práticos que o candidato, porque ainda não eleito - lá está - vai usar para cumprir com as suas obrigações e programa.
Ao ver o que se vê, nem pretendam calar os críticos que possam ter caído em tal engano. Todos têm direito a errar... Este caso, pelo que se vê, parece ter sido um deles.