Vejo esta grafia e o seu inexorável
nestas frias margens que por letras
partem à conquista de outras laudas:
as que aqui se erguem bem no centro
onde um planador – ou um avião de corda,
com as suas asas frágeis, vagarosas –
procura sobre a água um arco de platina,
procura entre as nuvens todo o azul
da absoluta liberdade, o caos possível.
Vejo o invisível (paradoxo, eu sei)
que escorre sobre o banco das viagens
ou dos arredores de tantos animais:
os de piscos lépidos, de cegonhas alçadas
nos outeiros ou de serpentes mágicas
que a memória transforma em pesadelos.
Também vejo o grafismo de quais dedos
navegam à deriva por lampejos
e sombras de outros corpos
- reais ou imaginários;
ou o dos lábios que vão no beiral
de outras línguas, de outro mosto,
de outra memória quente
que nos baste.
JOÃO RUI DE SOUSA
Grafismos, Fulgurações
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"Roteiro
Meu jeito visionário — meu astrolábio.
Meu ser mirabolante — um alcatruz.
De variadas coisas fiz a minha esperança
e sempre em várias coisas vi a minha cruz.
Aos padrões que em vários pontos encontrei
na rota íntima de vestes tropicais
eu dei as mãos, serenas e intactas,
as minhas dores mais certas e reais.
Nos vários sítios que — abismos —
toldaram minha voz por um olhar,
eu evitei o perigo e os prejuízos
à voz feita de calma, meu cantar.
Aos rasgos que, de outrora, evocados
foram sempre pelo seu valor,
eu dei a minha tez de dúvida e de espanto,
o meu silêncio amargo, o meu calor,
E aos pontos cardeais que em volta, vacilantes,
desalentavam já meu ser cativo,
parei o gesto, roubei o pólo sul da esperança
como lembrança para um dia altivo."
João Rui de Sousa
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