quinta-feira, 3 de abril de 2008

caminho


No espaço que perdeste o rasto
Fui percorrer lamúrias de procura
Imaginando aquele pleno fausto
De te rever, justo à cintura.

Dava passo a passo
Sonhando o devaneio
De te intentar no espaço
Que se cuida ser a meio.

E me castigava desses pensamentos
Os que imaginava, só nesses momentos
Serem quase carnais e até obscenos
Quando só mortais, simples acenos.

Pois era o caminho que dava o alento
E ia sozinho, sem tino ou provento.
O caminhar é isso, só e afinal:
O encantar o sentimento pessoal.

22 comentários:

Anónimo disse...

"Meu doido coração aonde vais,
No teu imenso anseio de liberdade?
Toma cautela com a realidade;
Meu pobre coração olha que cais!

Deixa-te estar quietinho! Não amais
A doce quietação da soledade?
Tuas lindas quirneras irreais,
Não valem o prazer duma saudade!

Tu chamas ao meu seio, negra prisão!
Ai, vê lá bem, ó doido coração,
Não te deslumbres o brilho do luar!...

Não 'stendas tuas asas para o longe..
Deixa-te estar quietinho, triste monge,
Na paz da tua cela,a soluçar..."

Florbela Espanca

Anónimo disse...

AH, doido coração, é bem verdade, que me rasgar o pensar a menos de metade....

(parece que descobriram finalmente o que já se tinha por certo: quando apaixonados, o cérebro perdeu várias funções)

AH, doido coração...

Anónimo disse...

E cérebro também... Não era isso.

Mas quando não estamos apixonados (as) será que o coração perde também algumas?

Anónimo disse...

"A minha voz não ouve a voz do vento
A minha mão não sente a mão que sinto
Os meus olhos não vêem o que eu vejo
Desisto e invejo o que me dá alento

Seduzo-me a tentar mas não me tento
Pretendo-me sem dar-me o pretendido
Se busco perco-me onde não há p’rigo
Nutro de olvido com que me sustento

Se por aqui não venho ali não sigo
O que m traz por cá foi-me esquecendo
Desfaço o feito e faço o presumido
Nada consigo e nisto vou cedendo

Nisto prossigo e nisto me entendendo
(A voz de bronze que me traz consigo)
Ó minha amada vê como estou vendo
Ceia também comigo ó meu amigo"

Zeca Afonso

Anónimo disse...

"Se eu pudesse havia de... de...
transformar as palavras em clava!
havia de escrever rijamente.
Cada palavra seca, irressonante!
Sem música, como um gesto,
uma pancada brusca e sóbria.
Para quê,
mas para quê todo o artifício
da composição sintáctica e métrica,
este arredondado linguístico?
Gostava de atirar palavras.
Rápidas, secas e bárbaras: pedradas!
Sentidos próprios em tudo.
Amo? Amo ou não amo!
Vejo, admiro, desejo?
Ou não... ou sim.
E, como isto, continuando...

E gostava,
para as infinitamente delicadas coisas do espírito
(quais? mas quais?)
em oposição com a braveza
do jogo da pedrada,
da pontaria às coisas certas e negadas,
gostava...
de escrever com um fio de água!
um fio que nada traçasse...
fino e sem cor... medroso...
Ó infinitamente delicadas coisas do espírito...
Amor que se não tem,
desejo dispersivo,
sofrimento indefinido,
ideia incontornada,
apreços, gostos fugitivos...
Ai, o fio da água,
o próprio fio da água poderia
sobre vós passar, transparentemente...
ou seguir-vos, humilde e tranquilo?"

(Irene Lisboa)

Anónimo disse...

"Se depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,
Não há nada mais simples.
Tem só duas datas - a da minha nascença e a da minha morte.
Entre uma e outra todos os dias são meus."

Fernando Pessoa/Alberto Caeiro

Anónimo disse...

Entre uma e outra, todos os dias são meus;
assim me identificarei no arribar dos céus;
a data do nascimento sabe S. Pedro,
a de morrer, já nem me mete medo.

Não sei se leve o registo das bem-aventuranças,
essas que em novo me encheiam de esperanças
e tanto desbaratei ao longo da vida
por vezes só com a ilusão duma mulher perdida.

Seja como for, apresentar-me-ei sozinho
que essa é a condição que o homem tem:
respeitar em Terra o mau vizinho,
entregar-se no Céu já sem ninguém.

Anónimo disse...

A nossa crença na realidade da vida e na realidade do mundo não são, com efeito, a mesma coisa. A segunda provém basicamente da permanência e da durabilidade do mundo, bem superiores às da vida mortal. Se o homem soubesse que o mundo acabaria quando ele morresse, ou logo depois, esse mundo perderia toda a sua realidade, como a perdeu para os antigos cristãos, na medida em que estes estavam convencidos de que as suas expectativas escatológicas seriam imediatamente realizadas. A confiança na realidade da vida, pelo contrário, depende quase exclusivamente da intensidade com que a vida é experimentada, do impacte com que ela se faz sentir.
Esta intensidade é tão grande e a sua força é tão elementar que, onde quer que prevaleça, na alegria ou na dor, oblitera qualquer outra realidade mundana. Já se observou muitas vezes que aquilo que a vida dos ricos perde em vitalidade, em intimidade com as «boas coisas» da natureza, ganha em refinamento, em sensibilidade às coisas belas do mundo. O facto é que a capacidade humana de vida no mundo implica sempre uma capacidade de transcender e alienar-se dos processos da própria vida, enquanto a vitalidade e o vigor só podem ser conservados na medida em que os homens se disponham a arcar com o ónus, as fadigas e as penas da vida.

Hannah Arendt,"A Condição Humana"

..."as penas da vida"...se possível,SUAVES!!!

Anónimo disse...

"quero ser um princípio e não um fim. que, depois de mim, as tempestades sejam outras e as lágrimas mais leves!"

António Quadros

Anónimo disse...

Porque o caminho se faz caminhando....no meio da poesia que me tem tornado o córrego mais SUAVE:
"O caminhar é isso, só e afinal:
O encantar o sentimento pessoal."

Só possível porque..."todos os dias são meus"

Egoísmo?Não!!!ESSA a razão da POESIA!!!!

Anónimo disse...

"O suspeito foi calado
Não tendo as provas na mão
Não sabemos por que fado
Estando longe dele, então

Não teve companhia,
E nem reclamar ninguém,
Não chegou a ser refém,
Esteve ausente por um dia.

É nas pedras da calçada,
Que a canção nos sai melhor,
É nas pedras da calçada,
Que o desejo abafa a dor

Ofereceste-me uma rosa,
Quanto vale ao fim da vida?
Vale a voz silenciosa,
Vale a testa adormecida.

É nas pedras da calçada,
Que a canção nos sai melhor,
É nas pedras da calçada,
Que o desejo abafa a dor."

Jorge Palma

Anónimo disse...

"a poesia é a charrua que opera sobre o tempo para fazer emergir o que, nele, repousa no profundo"

Ossip Mandelstam

Anónimo disse...

Aos anónimos (desconhecidos),
Aos poetas
Aos que teimam nos caminhos
Lançando p'ra longe as metas.

Aos córregos que sulcamos...

Anónimo disse...

"Toda a poesia é luminosa, até
a mais obscura.
O Leitor é que tem às vezes,
em lugar de sol, nevoeiro dentro de si.
E o nevoeiro nunca deixa ver claro.
Se regressar
Outra vez e outra vez
e outra vez
e essas sílabas acesas
ficará cego de tanta claridade.
Abençoado seja de lá chegar."

Eugénio de Andrade

"Aos poetas
Aos que teimam nos caminhos
Lançando p'ra longe as metas.

Aos córregos que sulcamos..."

Anónimo disse...

“……..Nascemos para manifestar
a glória do Universo que está dentro de nós.
Não está apenas em um de nós: está em todos nós.
E conforme deixamos nossa própria luz brilhar,
inconscientemente damos às outras pessoas
permissão para fazer o mesmo.
E conforme nos libertamos do nosso medo,
nossa presença, automaticamente, libera os outros.”

Nelson Mandela
"No espaço que perdeste o rasto"

Anónimo disse...

Está uma quentura solarenga que nos dá a Primavera de mãos cheias e nos ilumina mais o caminho a percorrer. Ao mesmo tempo, porém, deixa no ar e nos corpos um cansaço que nos entrega à monotonia.

Dá para o sono e não para a poesia!

Anónimo disse...

"Sou um guardador de rebanhos.
O rebanho é os meus pensamentos
E os meus pensamentos são todos sensações.
Penso com os olhos e com os ouvidos
E com as mãos e os pés
E com o nariz e a boca.
Pensar numa flor é vê-la e cheirá-la
E comer um fruto é saber-lhe o sentido.
Por isso quando num dia de calor
Me sinto triste de gozá-lo tanto,
E me deito ao comprido na erva,
E fecho os olhos quentes,
Sinto todo o meu corpo deitado na realidade,
Sei da verdade e sou feliz."

Alberto Caeiro

...quentura solarenga que
deixa no ar e nos corpos um cansaço que nos entrega à monotonia...mas SEMPRE dá para a POESIA!

Anónimo disse...

???

Anónimo disse...

"Diremos prado bosque
primavera,
e tudo o que dissermos
é só para dizermos
que fomos jovens
Diremos mãe amor
um barco,
e só diremos
que nada há
para levar ao coração
Diremos terra mar
ou madressilva,
mas sem música no sangue
serão palavras só,
e só palavras, o que diremos"

Eugénio de Andrade

Anónimo disse...

"Eu, dar flor, já não dou.
Mas vós, ó flores, pois que Maio chegou,
Revesti-o de clâmides de cores!
Que eu, dar flor, já não dou.
Eu, cantar já não canto.
Mas vós, aves,
Acordai desse azul, calado há tanto,
As infinitas naves!
Que eu, cantar, já não canto.

José Régio

"Aos que teimam nos caminhos
Lançando p'ra longe as metas."

Anónimo disse...

Cá eu, vou agora usar o Torga,imaginando que pelo caminho (das pedras?)se perdeu o objecto da procura:
Adeus
é um adeus...
não vale a pena sofismar a hora!
é tarde nos meus olhos e nos teus...
agora,
o remédio é partir discretamente,
sem palavras,
sem lágrimas,
sem gestos.
de que servem lamentos e protestos
contra o destino?
cego assassino
a que nenhum poder
limita a crueldade,
só o pode vencer a humanidade
da nossa lucidez desencantada.
antes da iniquidade
consumada,
um poema de líquido pudor,
um sorriso de amor
e mais nada.

Anónimo disse...

Cá vai um outro adeus, este de Régio:

Adeus
Vai-te, que os meus braços te magoaram,
E o meu amor não beija!, arde e devora.
Foram-se as flores do meu jardim. ficaram
Raízes enterradas, braços fora...

Vai-te! O luar é para os outros, e os afagos
São para os outros..., os que ensaiam serenatas.
Já a lua que nos lagos bóia pérolas e pratas
Não nasce para mim, que estou sem lagos.
(...)
Vai-te!, que eu fui chamado a conquistar
Os mundos que há nos fundos do meu nada.
Talvez depois reaprenda a inocência de amar...
Talvez... mas ai!, depois de que alvorada?

Porque até Lá, é longe, e é tão incerto,
Tão frio, tão sublime, tão abstracto, tão medonho...
Como dar-te a sonhar este sonho mdum sonho?

- Vai-te! a tua casa é perto.