terça-feira, 18 de março de 2008

em nome do Pai

Antecipando o dia (apenas nesta Jardim Atlântico, pois o tempo é mesmo muito relativo e São José já nasceu em tantos pedaços de Mundo…) copio dois poemas “em nome do Pai”. Precisamente da antologia com esse nome (Modo de Ver, editores e livreiros, lda – jornal Público).


A vida é feita de nadas:
De grandes serras paradas
À espera de movimento;
De searas onduladas
Pelo vento;

De casas de moradia
Caídas e com sinais
De ninhos que outrora havia
Nos beirais;

De poeira;
De sombra de uma figueira;
De ver esta maravilha:
Meu pai a erguer uma videira
Como uma mãe que faz a trança à filha
.

Miguel Torga, Bucólica.


O que não fizermos sozinhos,
fazemo-lo agora solitários
recriando a natureza
até nos filhos dos outros.
Devolvendo amor de pai
ambientando em lembranças
vivas, tão vivas!, que a morte
nada pode contra elas.
Condição mais do que dúbia,
mas certa. Educar os filhos
a serem igual aos pais,
tal como foram amigos
ou lhes criámos a imagem.

Porque os pais são mortos vivos
e nós somos vivos mortos.

Reparem os meus ouvintes:
eu não me quero sentir morto
e chamo aos filhos dos amigos
os meus filhos.

Ruy Cinatti, Didáctica

1 comentário:

Anónimo disse...

"Ninguém é filho do poema universal.
Nem pai
do seu rebanho de versos.
O que eu busco é um lar.
Um lar mais natural das palavras
da terra
com os lábios invisíveis sobre o livro
dos mortos."

Armando Silva Carvalho, O que foi passado a limpo.