quinta-feira, 29 de outubro de 2009

A Insustentável Leveza da Ignorância

"(...) O que me traz ao aspecto mais perturbador e alarmante de toda esta tola controvérsia. Os jornalistas e os responsáveis religiosos portugueses de um modo geral tratam os comentários de Saramago como importantes! Graças a eles, os meios de comunicação deram-lhe mais tempo na televisão e mais espaços nos jornais do que a outras questões mais importantes. E alguns representantes da Igreja Católica atacaram-no com uma ferocidade emocional que revela bem que consideram tais opiniões sobre o antigo testamento como um obstáculo à fé. Mais uma vez, como salientai mais atrás, os comentários de Saramago não são chocantes nem novos. E apenas representam um obstáculo à fé para quem não tenha a menor ideia do que é que pretendia ser o Antigo Testamento. As críticas de Saramago são unicamente banalidades superficiais, que revelam uma profunda ignorância da filosofia e da religião ocidentais e uma total incompreensão da linguagem poética e narrativa de desde há mais de três mil anos. Só quem ignora tal herança, jornalistas e responsáveis religiosos incluídos, podiam tornar o patético desabafo do romancista numa tal polémica. E, para mim, essa foi a parte mais perturbante de toda esta “inventada” noticia: descobrir que na sociedade onde vivemos, entre os seus membros mais ilustres e cultivados, possa prolongar-se tão lastimosa ignorância de uma parte importantíssima do legado civilizacional da filosofia e da cultura ocidentais."


Richard Zimler
Jornal Público de 27 de Outubro de 2009
Tradução de José Lima

domingo, 25 de outubro de 2009

Passos no vai e no vem da busca, sempre ao encontro
de um farol que desvende a calma do céu e do mar

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

cor local



Para o Amigo Augusto, que sabe bem que o refúgio nas Beiras é certo e sempre seguro.

sábado, 17 de outubro de 2009

Bocage

Adamastor cruel! De teus furores
Quantas vezes me lembro horrorizado!
Ó monstro! Quantas vezes tens tragado
Do soberbo Oriente os domadores!
Parece-me que entregue a vis traidores
Estou vendo Sepúlveda afamado,
Co'a esposa e co'os filhinhos abraçado,
Qual Mavorte com Vénus e os Amores.
Parece-me que vejo o triste esposo,
Perdida a tenra prole e a bela dama,
Às garras dos leões correr furioso.
Bem te vingaste em nós do afoito Gama!
Pelos nossos desastres és famoso.
Maldito Adamastor! Maldita fama!

SONETOS
José Manuel Maria Barbosa du Bocage

Sem título, nome ou paciência

1

entrei “na noite pelo lado onde há menos gente”

porque o silêncio se esbate só contra

os rostos vagos dos granitos nas calçadas

e posso respirar o sereno olhar

do que não vejo.

a cidade, essa, a cidade

grita no reverso do meu passo

e engole o eco do que adivinho. lá longe

uma mulher de espuma, junto do mar,

retribui uma palavra que perdi há décadas

quando me açoitava

nas turbulências da multidão.


2.

“eu enlouqueço com a doçura

dos meses vagarosos”, este fevereiro tem

os mesmos 1000 anos como tinha há trinta,

exactamente quando enlouqueceste

o beijo que se partiu na minha boca

e nunca mais fui homem

de trincar outros desejos

(e nem)

de desejar bocas novas

perdido

sem me entregar

perdido

a esperar

sem esperar

só aceitar (apenas)

o aguardar da noite: que

a artificiosa luz me prenda de consolo.

(dois decalques de herberto helder, peço desculpa...) 16.02.2009

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Asterix


O desenhista Albert Uderzo e o editor Albert René publicarão em 22 de outubro ao redor do mundo a obra "L'anniversaire d'Astérix et Obélix, le livre d'or" ("O Aniversário de Asterix e Obelix, o livro de ouro", em tradução livre), o último álbum do herói gaulês, que completa 50 anos.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

domingo, 4 de outubro de 2009

O Jardim do Éden

"A caminho daqui vi coisas maravilhosas para pintar, mas nunca soube pintar. Sei de coisas maravilhosas para escrever e nem sequer consigo escrever uma carta que não seja estúpida. Nunca quis ser pintora nem escritora até chegar a este país. Agora, é como estar-se sempre esfomeado e não haver maneira de o remediar."

O Jardim do Éden
Ernest Hemingway
Colecção Mil Folhas
Julho de 2002
Tradução de Ana Maria Sampaio

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

O meu voto? Eu é que o deposito!

Ainda no esmiuçar dos escrutínios - passe a referência ao programa da Sic - o tema desta posta "rouba" o seu mote a uma pequena discussão crítica que surgiu no Twitter, entre mim, @31daSarrafada e @ponteeuropa , a propósito de um apontamento deste último no blog homónimo.
De facto, de acordo com a lei eleitoral em vigor, para a Assembleia da República, após votar, o cidadão eleitor dirige-se à mesa e deve entregar o seu voto ao presidente, a fim de que ele, e apenas ele, insira o boletim dentro da urna - cfr. artigo 96º nº5.
Ora, ao que parece o nosso Presidente da República não o fez. Na verdade, a fotografia, tirada pelos órgãos de comunicação social, não deixa margem para dúvidas.
Nestes casos, a mesma lei já citada, prevê, no seu artigo 168º, o pagamento de uma multa - ou deveria ser coima? - que pode ir desde os mil aos dez mil escudos - a verborreia legislativa e a fúria gorilácea de quem a produz, poupou este diploma legal à modernidade, podendo ainda sentir-se a nostalgia pela moeda antiga...
Não parece que ao Presidente da República tenha sido aplicada aquela sanção. Não foi aplicada a Cavaco Silva nem a outro político qualquer que certamente já fez o mesmo, tendo todos nós a leve recordação disso mesmo - pose para a fotografia, sorriso, depósito do boletim pela própria mão, um "bacalhau" ao responsável máximo da mesa e um "bom dia, meus senhores, bom trabalho".
Contudo, este mesmo detalhe, legalmente consagrado, se pôde até agora passar-me despercebido, levantou em mim algumas inquietações. E deixo já aqui claro: não me interessa que seja o Presidente da República, o Primeiro-Ministro, um qualquer deputado ou o "Manuel das Couves", o sujeito que possa vir a cometer a "infracçãozinha".
E digo justamente "infracçãozinha", porque a norma me parece ridícula e ainda herdeira de um paternalismo bacoco.
É que se, por um lado, aceito que ao presidente da mesa devem ser dados todos os poderes para a coordenação de um acto que se quer ordeiro, rigoroso e transparente, não aceito, por outro, que existam prerrogativas nascidas apenas em virtude da formalidade de um cargo. "Eu é que sou... o prrreeeesidente da mesa..." - já dizia o "boneco" do Herman, no sketch do "Parabéns", em Janeiro de 96, acerca das Presidenciais desse ano.
Na verdade, na entrega do boletim de voto ao presidente da mesa pode estar implicado um acto de transmissão da posse, ou até mesmo da propriedade, que me choca, porque contrário à ideia republicana da soberania popular.
Ou seja, um cidadão ao votar, exerce o seu direito, cumpre o seu dever, numa atitude que se quer inteiramente pessoal, soberana. Sem necessidade de quaisquer intermediários que efectivem aquilo que, para todos os efeitos, é o último passo dessa forma de expressão democrática.
E, depois, partir do princípio que tal intervenção do presidente é necessária para "impor uma certa ordem" é o mesmo que dizer que os eleitores são uma cambada de desordeiros que não sabem comportar-se em tão solene acto, aguardando a sua vez, depositando serenamente o seu boletim na ranhura.
Por tudo isto, defendo, como já se calcula, que urge mudar a lei eleitoral no sentido da revogação da norma e, já agora, na actualização das quantias da "multa" aplicável às (outras, mais importantes) infracções.
E como manifesto pessoal assumo a minha posição: o meu voto? sou eu que o deposito! E é já nas próximas! Como sempre!

E este o post do @31daSafarrada, desenvolvido no decurso de tão estimulante querela.