quarta-feira, 31 de dezembro de 2008
terça-feira, 30 de dezembro de 2008
vida, caminho sempre à frente
segunda-feira, 29 de dezembro de 2008
Relatividade
Em 1971, Joseph Hafele e Richard Keating puseram relógios atómicos muito sofisticados a bordo de um voo num jacto comercial da Pan Am que deu a volta ao mundo. Quando compararam os relógios que voaram no avião com relógios idênticos que tinham sido deixados (estacionários) no solo, descobriram que tinha passado menos tempo nos relógios que se tinham movido. A diferença é minúscula – umas centenas de bilionésimos de segundo –, mas estava exactamente de acordo com as descobertas de Einstein.
Brian Green
O Tecido do Cosmos
Espaço, tempo e textura da realidade
Colecção Ciência Aberta
Gradiva
sábado, 27 de dezembro de 2008
sexta-feira, 26 de dezembro de 2008
Harold Pinter
Prosa
Kullus (1949)
The Dwarfs (1952-56)
Latest Reports from the Stock Exchange (1953)
The Black and White (1954-55)
The Examination (1955)
Tea Party (1963)
The Coast (1975)
Problem (1976)
Lola (1977)
Short Story (1995)
Girls (1995)
Sorry About This (1999)
God's District (1997)
Tess (2000)
Voices in the Tunnel (2001)
Poesia
War (2003)
Teatro
The room (1957)
The birthday party (1957)
The dumb waiter (1957)
The caretaker (1960)
A slight ache (1961)
The homecoming (1965)
Md Times (1971)
No Maris land (1975)
Fonte: wikipedia
quinta-feira, 25 de dezembro de 2008
(a cantar, com ou sem galo, até 2009...)
quarta-feira, 24 de dezembro de 2008
terça-feira, 23 de dezembro de 2008
Crónica do Rei Pasmado
O corpo de Marfisa tinha ficado meio a descoberto: deixava ver a cabeleira, as costas, a fina cintura, o arranque das nádegas. O Rei fitou-a. Com surpresa, com estupefacção.
- Viste coisa mais bela?
- Há muitas coisas belas no mundo.
- Mais do que o corpo de uma mulher?
- Se é o de Marfisa, dificilmente.
- Até ontem à noite, nunca tinha visto uma mulher nua.
- E então?
- O paraíso tem que ser uma coisa semelhante.
O conde torceu o nariz.
- Não creio que os senhores inquisidores aprovassem essa ideia.
- Que saberão os senhores inquisidores de mulheres nuas?
- Segundo eles, tudo.
O Rei já se encontrava meio vestido. O conde pediu a Lucrécia uma bacia com água fresca. O Rei começou a remexer na escarcela.
EDITORIAL CAMINHO
Gonzalo Torrente Ballester
Título original:
Crónica del Rey Pasmado
Tradução de António Gonçalves
(C) Gonzalo Torrente Ballester, 1989
Vincent van Gogh
segunda-feira, 22 de dezembro de 2008
Quando um Homem quiser
Numa cama de chuva com lençóis feitos de vento
Tu que tens o Natal da solidão, do sofrimento
És meu irmão amigo
És meu irmão
E tu que dormes só no pesadelo do ciúme
Numa cama de raiva com lençóis feitos de lume
E sofres o Natal da solidão sem um queixume
És meu irmão amigo
És meu irmão
Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher
Tu que inventas ternura e brinquedos para dar
Tu que inventas bonecas e comboios de luar
E mentes ao teu filho por não os poderes comprar
És meu irmão amigo
És meu irmão
E tu que vês na montra a tua fome que eu não sei
Fatias de tristeza em cada alegre bolo rei
Pões um sabor amargo em cada doce que eu comprei
És meu irmão amigo
És meu irmão
Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher
José Carlos Ary dos Santos
sábado, 20 de dezembro de 2008
mar esquecido
quando víamos horizonte e mar
Gaivotas volteavam traços, até
perderem voltas de desamarrar
Confirmávamos promessas antigas
ao desfazermos as perdidas brigas
O tempo parava no nosso olhar,
nem canções soavam no silêncio
no efeito da translação estancar,
mundo que não creio nem penso
O que se nos perdeu de eternidade
nesse espaço que nos traz ao hoje?
O que sabemos, se é da realidade,
tão pouco q' entre mãos nos foge?
(20.01.2008)
sexta-feira, 19 de dezembro de 2008
Perfume na escuridão
passos sem caminho
que oiço a respiração da tua vinda
mas cego o gesto
que te abraçaria
Deixa que o perfume
dos sonhos meeiros
te adivinhem o rosto
esse que os tantos anos
terão amassado
e foram desistindo
em corromper:
tenho a divina certeza
que teu sorriso
mantém o mesmo olhar
(de papoila luminosa
onde guardava os tesouros
imaginados de menino)
quinta-feira, 18 de dezembro de 2008
terça-feira, 16 de dezembro de 2008
segunda-feira, 15 de dezembro de 2008
faltavam para ele chegar.
Mas ele não chegou,
com o seu manto azul,
àquele pátio onde ela o esperava, todos os dias,
ano após ano,
com o rosário de sal das noivas eternas,
esquecido nas mãos.
Ela tinha tempo, era jovem,
e jovem o seu corpo e o seu coração.
A alma, porém,
navegara os oceanos,
perdera-se em cada porto,
em cada lenço de dizer adeus,
nos labirintos onde conheceu o esplendor das
navalhas,
o sangue que deixava o seu rasto num
umbral e numa esquina.
Era uma vida de açucenas desfeitas.
E ela ia e vinha, sonambulamente, apagando as
estrelas.
Tinha,
na boca entreaberta,
o travo amargo das laranjas doentes,
dos licores de ervas muito verdes que colhera na
infância dos países do mal.
Tinha medo.
Mas, serenamente,
continuava a contar as horas que faltavam
para ele chegar,
para que do seu manto azul se soltassem as
flores sem cor
que vivem na secreta transparência dos corais.
José Agostinho Baptista, Via-a Serenamente
Esta Voz É Quase O Vento
sábado, 13 de dezembro de 2008
Parabéns P. A.
Antes que a morte te leve, Ó leva tu isto de volta (Dylan Thomas)
A linha divisória
De facto, quando meditamos na significação do nosso próprio passado temos a impressão que ele enche o mundo inteiro em profundidade e em grandeza...
Só os jovens passam por momentos assim (...)
É neste período da vida que os momentos de que tenho estado a falar têm probabilidades maiores de acontecerem. Mas que momentos? Bem, momentos de tédio, de cansaço, de descontentamento. momentos de precipitação. Quer dizer momentos em que o jovem tende ainda, por força da sua natureza, a praticar actos irreflectidos, como casar de um instante para o outro ou abandonar descuidadamente um lugar que ocupava sem ter motivo algum para o fazer.
Aqui não se trata da história de um casamento. Comigo o caso não foi tão mau. A minha acção precipitada tal como se deu teve mais o aspecto de um divórcio... - quase de um abandono do domicílio conjugal. Sem razão alguma, susceptível de ser detectada por qualquer pessoa minimamente sensata, seixei o meu emprego - lancei borda fora o meu lugar no barco - desembarquei do navio, do qual a maior razão de queixa que eu podia ter seria apenas a de verificar que se tratava de um barco a vapor e que, por consequência, talvez fosse indigno da minha cega fidelidade ... Mas para nada serve tentar dar brilho àquilo que, mesmo nessa altura, bem suspeitei que não passaria de um capricho.
Joseph Conrad, Linha de Sombra, Relógio D'Água
sexta-feira, 12 de dezembro de 2008
quinta-feira, 11 de dezembro de 2008
Puro Vintage VI
A certa altura do ano, depois do regresso à escola e dos magustos, quando o frio já começava a apertar e a chuva era uma presença constante, Alexandre sabia que estava para breve um tempo mágico. Guiado pela mão da sua Mãe, que frequentemente acompanhava nas compras para a casa, entrava no supermercado de sempre e a mudança estava dada. Logo ali, nas primeiras prateleiras da entrada, expostos em série, os brinquedos acabados de chegar davam um novo ar, muito mais apetecível e acolhedor, ao espaço de sempre.
Com um ar solene e contemplativo, Alexandre procurava devorar com os olhos tudo aquilo em que as suas mãos não podiam tocar. "Não se pode mexer", dizia a sua mãe, sob o olhar atento e aprovador da dona do estabelecimento, vigilante e preocupada com o eventual prejuízo causado por um petiz naturalmente encantado e inquieto com tanto brilho, tanta novidade, que desejava alcançar. Carros a pilhas, construções, soldadinhos de chumbo, aviões, robôs eram para ele como arcas de tesouro, encerrando em si inúmeras estórias de aventura que ia construindo em sonhos despertos. Nuns outros tantos caixotes, ainda por abrir, Alexandre sabia existirem ainda mais pequenas maravilhas destas.
Àquela altura, já tinha trocado algumas impressões com os seus colegas acerca do que pedir no Natal. Agora, essa mesma lista de desejos estava a ser reformulada. Por outro lado, também comparava mentalmente, com acutilante sentido crítico, tudo o que ali via com outros brinquedos, vistos na sua cidade natal, no shopping de uma grande rua, à noite, após sair de casa dos seus avós que lá viviam.
Por fim, chegaria sempre à conclusão de que, entre uns e outros, o importante era conservá-los bem estimados (sim, porque prezava muito a sua fama de coleccionador zeloso e importado), na gaveta que tinha no roupeiro do seu quarto.
Contudo, neste seu alvoroço interior havia sempre espaço para outros desejos, para já bem mais fáceis de satisfazer, sabendo que ainda era cedo para qualquer decisão dos seus pais (eram eles que falavam com o Menino Jesus, segundo a sua mãe), quanto às prendas que apareceriam na chaminé da cozinha ou até mesmo na da sala dos seus avós. Assim, acto contínuo, Alexandre virava-se para a sua mãe e dizia baixinho "Quero um pai-natal" ou "Quero um carro de chocolate". Depois de alguns protestos pedagógicos, que nunca o deixavam de envergonhar porque eram ditos um pouco alto demais, o seu pedido era satisfeito. Em gestos cuidadosos, ia desembrulhando o papel de prata estampado que cobria a figura oca e castanha. Numa dentada, aquele doce sabor quente deixava-o entusiasmado, contente e um pouco mais sôfrego para os pedaços seguintes. Com grande parcimónia, contrária à idade de infante que tinha, procurava não sujar as mãos conforme o chocolate se ia derretendo. "Não te sujes!" - a advertência que mais ouvia.
quarta-feira, 10 de dezembro de 2008
Natal dos Fumadores
terça-feira, 9 de dezembro de 2008
Porto Santo
Eu queria uma ilha assim, onde tudo se resume à
evidência dos astros,
ao coração sereno.
A areia aquece as mãos abandonadas.
Prevejo o eclipse, o arco-íris e os teus passos.
Sei que vens, algures, pelas veredas onde o ouro
começa.
Não me procures tão perto das estacas do primeiro
cais.
Estou sempre encostado ao mar.
E as vagas que se erguem afastam levemente a minha
boca
e são como as lágrimas do teu amor.
Quem espreita atrás dos barcos?
As velas passam ao largo das tuas cidades.
Apagas-te devagar, fresca açucena desta saudade.
Inúteis são os búzios da minha loucura porque não
me ouves em outubro
quando a ilha não pertence ao mundo.
Em outubro pensei:
podia acabar aqui, encostado ao mar,
para que se saiba onde acabam os sonhos, onde moram
os assassinos,
onde, da vida já esquecido,
olho perdidamente à volta e sou a ave.
Sou a plumagem que arde. Sou a asa golpeada pelos
raios do teu furor
e não me peçam, não me peçam para cantar.
Na Fonte da Areia baixo a cabeça sobre o peito.
Fecho os olhos.
(...)
José Agostinho Baptista, Porto Santo
Canções Da Terra Distante
segunda-feira, 8 de dezembro de 2008
carpe diem
domingo, 7 de dezembro de 2008
Ainda dentro da estridente nebulosa
Que a palavra continue, escrevendo-se
ter-te tão breve
tu surgiste, ao tombar
de uma tarde escura e fria,
a inventares a companhia
ao meu lamento.
por um momento
(só um momento)
imaginei voltar a ver no tempo eternidade,
deixava fingir - e fugir - a idade
no esgar de te ver
tão leve.
de te ter
tão breve.
(15.12.2007)
sábado, 6 de dezembro de 2008
Afonso, o 1.º
sexta-feira, 5 de dezembro de 2008
Espero, mesmo em Dezembro e à chuva
A chuva lavou das línguas as palavras quentes.
Dezembro é mês de melancolia e sem repentes.
Fica difícil soletrar-te sílabas coloridas.
A cor do sol encobre-se com a da terra.
Perdemos luz, mas ganhamos em vidas.
O nosso encanto é só um jogo de espera.
W. A. MOZART
quinta-feira, 4 de dezembro de 2008
Perseguição da beleza
Foto: Pedro Paixão
Descrição Da Mentira
terça-feira, 2 de dezembro de 2008
"refundação do sistema" financeiro
segunda-feira, 1 de dezembro de 2008
domingo, 30 de novembro de 2008
entre as gargalhas e o choro
Por Amor
“No dia a que se reportam os autos, estando a arguida na cozinha e o filho no quarto, preparou um chá, no qual deitou o conteúdo do frasco de Paratião, dizendo-lhe que bebesse porque lhe iria fazer bem”.
A ideia surgiu-lhe naquele instante. Preparou o chá e açucarou-o bem, como sabia que Pedro gostava. Depois, pegou no frasco do veneno e verteu-o na chávena. Misturou tudo e deu-lhe sabor com um cálice de Porto.
- Bebe, meu filho, bebe que te vai fazer bem! – disse-lhe, os olhos rasos de água.
“A arguida agiu com intenção de matar o filho”.
- Levante-se a ré – disse o juiz do meio. Maria do Rosário nem o ouviu.
Foi preciso o seu advogado chegar junto dela e abaná-la para que o espírito voltasse de novo à sala.
- Quer dizer mais alguma coisa em sua defesa? – tornou o juiz.
- Tanto se me dá ir para a cadeia como ficar cá fora. A vida para mim acabou. Faça de mim o que quiser, senhor doutor juiz. Gerei o meu filho por amor. E foi por amor que o matei.
(In)justiça
Os disfarces de Arlequim
- Escusas de me estar sempre a lembrar isso! - notava-se que Scarlett não estava nada à vontade - Já vivi essa maldita cena mais do que mil vezes! A Maggie sempre podia ter-me dado um fim melhor!
- É isso, Scarlett. Nenhuma de nós é perfeita. Se temos uma ideia, se representamos uma ideia, outras nos hão-de faltar. Não somos criaturas completas, completamo-nos umas às outras. Por isso, concordei com Maria quando disse que estávamos todas de acordo. Eu luto pela condição feminina, a Florbela pela condição apaixonada, a Isadora pela condição corporal e a Scarlett pela condição patriótica.
- Sem terem uma pátria, não sentem o corpo, sem sentirem amor, não se sentirão femininas, sem serem femininas, não darão valor ao corpo, sem gostarmos de nós próprios, de que nos vale a paixão? Tudo se completa... - Era Florbela que rematara.
Maria estava confusa. Muita coisa ainda não percebera.
- Mas porquê eu?
Foi Isadora na sua precoce infantilidade que lhe respondeu.
- Porque tu, Maria Sklodowska, vais-nos suplantar a todas. Embora todas nós sejamos portadoras de ideias universais, todas nós somos, no fundo, umas egoístas, só pensamos em nós próprias ou naqueles que nos estão muito próximos. Eu cultivo o meu corpo, a Florbela inventa príncipes encantados para a sua desdita, a Simone combate pela causa feminina, excluindo portanto, os homens e a Scarlett luta pelo seu castelo de terra ali para o Sul do Novo Continente. Tu, não, Maria, tu vais construir uma obra verdadeiramente universal em proveito de um progresso tecnológico que, fatalmente, terá de acompanhar o fulgor das ideias e das emoções. Vai para o laboratório mas não te esqueças das lágrimas apaixonadas da pobre da Florbela, da garra e sentido patriótico da Scarlett, da força da militância da Simone que luta pelo que quer alcançar e da minha sensualidade improvisada, dos meus sentidos, dos meus saltos, do amor próprio, do orgulho em seres quem és. A Ciência sem isso, nada será, apenas fará perigar a nossa vida...
jjjjjjjjjjjjjjj
sábado, 29 de novembro de 2008
A justiça por um conto
Um ciclo da água
Males de Dirceu
A Luísa, o Marco e um pequeno apartamento
O Senhor Fortunato
A caminho de Santiago
Processo Tutelar n.º 37/01. Mariana
sexta-feira, 28 de novembro de 2008
W. B.
William Blake, pintor e poeta inglês, nascido em Londres a 28 de Novembro de 1757
No tempo da semeadura, aprende; na colheita, ensina; no inverno, desfruta. Conduz teu carro e teu arado por sobre os ossos dos mortos. A estrada do excesso leva ao palácio da sabedoria. A Prudência é uma solteirona rica e feia, cortejada pela Impotência. Quem deseja, mas não age, gera a pestilência. O verme partido perdoa ao arado. Mergulha no rio quem gosta de água. O tolo não vê a mesma árvore que o sábio. Aquele, cujo rosto não se ilumina, jamais há de ser uma estrela. A Eternidade anda apaixonada pelas produções do tempo. A abelha atarefada não tem tempo para tristezas. As horas de loucura são medidas pelo relógio; mas nenhum relógio mede as de sabedoria (…)
William Blake, Provérbios do Inferno
memória refeita nas folhas tombadas (variação I)
(além da idade... -
envoltos nos trapos de
um coração ausente)
e, de repente,
cirzo as lembranças
esfiapadas
dos retalhos de um sorriso antigo
- é contigo;
ele que me faz das memórias
um arco-íris.
Foi quinta-feira e
choveu oiro
nas cores sobrantes do verão indiano
(não é assim, contigo, todo o ano?)
que te espelha o brilho no da terra.
Gosto é dos amarelos.
Só para não ter que sonhar
os teus cabelos.
quinta-feira, 27 de novembro de 2008
quarta-feira, 26 de novembro de 2008
Mário Cesariny
terça-feira, 25 de novembro de 2008
segunda-feira, 24 de novembro de 2008
102 (24.11.1906)
Abro os olhos novamente.
Neste abrir e fechar de olhos
já todo o mundo é diferente.
Já outro ar me rodeia;
outros lábios o respiram;
outros aléns se tingiram
de outro Sol que os incendeia.
Outras árvores se floriram;
outro vento as despenteia;
outras ondas invadiram
outros recantos de areia.
Momento, tempo esgotado,
fluidez sem transparência.
Presente, espectro da ausência,
cadáver desenterrado.
Combustão perene e fria.
Corpo que a arder arrefece.
Incandescência sombria.
Tudo é foi. Nada acontece.
ANTÓNIO GEDEÃO, Tudo é foi
domingo, 23 de novembro de 2008
Dá cá uma raiva...
Estás deitado na tua cama; luz apagada, olhos bem fechados e perguntam:
- Estás a dormir?
- Não! Estou a treinar para morto.
2.
Levas um electrodoméstico para reparar e o técnico pergunta:
- Está avariado?
- Não! Ele estava aborrecido de estar por casa e eu trouxe-o para passear.
3.
Está a chover e percebem que vais sair à chuva. Perguntam:
- Vais sair com esta chuva?!
- Não! Vou sair com a próxima.
4.
Acabas de tomar banho e alguém pergunta:
- Tomaste banho?
- Não! Está a chover no WC.
(com agradecimento a j.f.p.)
sábado, 22 de novembro de 2008
Máquina
desenham a palavra
sua parente desumanidade
Como metáfora porém a utilizas
nomeando a teia desse mundo
que os deuses amam e odeiam
João Pedro Mésseder, Ordem alfabética
sexta-feira, 21 de novembro de 2008
a raiz do teu gesto
a raiz do teu gesto
encontrei-a naquela barca à vela
mas foi a nau catrineta
que me disse onde não estavas
por isso fui
sempre
levado pela maresia
quando sabia
que tu eras menos do que gesto
francisco d'eulália, A raiz do teu gesto, poemas
quinta-feira, 20 de novembro de 2008
Com estados de alma
quarta-feira, 19 de novembro de 2008
Carta
Não, comecei mal. É absurdo usar contigo o mesmo tratamento a que recorro quando quero assinar uma revista, escrever aos clientes ou mesmo reclamar de um serviço.
Tu, cujo nascimento significou para mim um mundo de novas possibilidades – saberias jogar à bola e brincar aos polícias e ladrões? Conseguirias, ainda que daí a mais tempo do que eu gostaria de admitir, ler os livros que eu começava a espreitar, ou fazer pistas de carros no nosso infinito corredor, cheias de pontes e túneis?
Nesse momento, tudo me pareceu muito confuso (e tu, muito vermelho e enrugado…). Mas sei, ainda, com que bonecos brincava quando o Pai me veio dar a notícia, e não me poderia nunca esquecer que foi na minha direcção que andaste sem ajuda pela primeira vez.
Por isso, e muito mais que não conseguiria dizer, tenho de recomeçar, desta vez com o único vocativo digno de ti.
Meu irmão:
Preciso de desabafar. Confissão rara num primogénito, que mais se assemelha a uma fortaleza inexpugnável: preocupado com o crescimento dos seus irmãos, pronto a resolver os sarilhos deles, quase se sentindo responsável se algo corre mal, acaba por não ter sequer tempo para admitir os seus próprios problemas, quanto mais para os resolver.
Só que, tendo os outros irmãos muito mais perto, porquê logo tu? É simples.
Manhã de Júbilo
Convivi mal com a minha infidelidade. Faltava-me a destreza, que só com o hábito se adquire, para relegar o remorso para as rápidas orações do fim do dia. Por outro lado, o meu casamento, ao contrário dos das grandes fortunas, não tinha por pressuposto essas curvas do caminho, que se aceitam até com alívio, por significarem que a ordem natural das coisas continua a funcionar. Nesses grandes contratos, regados a champanhe francês nos jardins dos solares da família, sabe-se que o prazer não faz parte do dote, pelo que se aceita com a dignidade do cumprimento de uma cláusula, que cada um se governe como muito bem entende. Quem se vincula por uma dessas festas sabe que um valor vale se prosseguir um fim, sendo que a manutenção dos casamentos, como forma de sobrevivência das castas, é, sem dúvida, um fim indiscutível. Mas a fidelidade, nessas esferas, não é estritamente essencial à manutenção dos casamentos, que sobrevivem à custa de outros esforços e expedientes.
Renascer
Ana tentou descontrair um pouco. Não era fácil. Ainda sentia a euforia póstuma dos momentos vividos com intensidade.
Revia mentalmente os acontecimentos da última semana. A conferência Ibero-Americana, sobre violência doméstica, na qual participara, superou as suas melhores expectativas. Havia sido magnificamente acolhida pelos colegas brasileiros. Nada que devesse constituir factor de surpresa, porquanto, em todas as viagens de férias que fizera aquele país, sempre se havia sentido em casa.
Agora, apenas oito horas de travessia atlântica a separavam do marido e filhos, que a esperariam em Lisboa.
Havia que voltar à rotina diária: lidar com os conflitos simbolizados e corporizados pelos processos que, inapelavelmente, se amontoavam no seu gabinete de trabalho.
Enfim, retomar as responsabilidades adiadas, por uma semana que primara pelo contraste com o frenesim do seu quotidiano pessoal e profissional.
Apesar de tudo, considerava-se afortunada e nem por um momento punha em causa a escolha profissional que havia feito, ainda era uma criança.
Veio-lhe à memória essa época.
Em especial, o dia em que a pretexto de um trabalho escolar, pediu aos pais fotografias da sua infância.
Já por diversas vezes havia estranhado o facto de aqueles nunca terem relatado o seu nascimento, nem terem feito referência aos seus primeiros passos.
E foi nesse dia, que os pais, emocionados, lhe revelaram não ter acompanhado o período em relação ao qual não havia registo fotográfico na sua casa.
A Senhora Sem Nome e a Outra Senhora
Os olhos do juiz mais novo esbugalhavam uma surpresa que emparelhava com a admiração de uma prematura ruga, a franzir-lhe na testa: o atrevimento do delegado! O juiz-presidente arrastou ninguém até ao silêncio. Mas logo alteou o tom, de peito cheio:
- Foi magia, doutor Almeida: a senhora, era assim que se chamava e tinham-se esquecido, disse que às vezes deixava a identidade na mesinha de cabeceira, não fosse perdê-la no ruedo, e a autoridade não lhe permitira ir à sua cata. Claro que eu interrompi o julgamento, doutor Almeida... deixei as teorias lá onde devem ficar e, passado nem cinco minutos, a senhora tinha nome, tinha os demais adereços e até tinha cartão de identidade... e tudo se resolveu. Sei lá se contra a lei!
- Sei lá! – mal se ouviu ao mais novo.
- Sei lá... – nem se ouviu ao doutor Fernandes.
- Como vê, doutor Almeida, a surpresa atacou-me na ocasião mais frágil, mas a solução -... e aí é que quero chegar – reforçou-me o entendimento: cada dia é um caso, cada caso é um olhar; depois, há sempre gente... atrás das teorias.
kkkkkkkkkkkkkkkkkkkk