Via-a serenamente, a contar as horas que
faltavam para ele chegar.
Mas ele não chegou,
com o seu manto azul,
àquele pátio onde ela o esperava, todos os dias,
ano após ano,
com o rosário de sal das noivas eternas,
esquecido nas mãos.
Ela tinha tempo, era jovem,
e jovem o seu corpo e o seu coração.
A alma, porém,
navegara os oceanos,
perdera-se em cada porto,
em cada lenço de dizer adeus,
nos labirintos onde conheceu o esplendor das
navalhas,
o sangue que deixava o seu rasto num
umbral e numa esquina.
Era uma vida de açucenas desfeitas.
E ela ia e vinha, sonambulamente, apagando as
estrelas.
Tinha,
na boca entreaberta,
o travo amargo das laranjas doentes,
dos licores de ervas muito verdes que colhera na
infância dos países do mal.
Tinha medo.
Mas, serenamente,
continuava a contar as horas que faltavam
para ele chegar,
para que do seu manto azul se soltassem as
flores sem cor
que vivem na secreta transparência dos corais.
José Agostinho Baptista, Via-a Serenamente
Esta Voz É Quase O Vento
segunda-feira, 15 de dezembro de 2008
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4 comentários:
Serenidade essa que me fez suspirar e alcamar minha noite. Um sonho, breve sono.
Magníficas suas sitações. Nunca deixo-me afastar!
Com açúcar, com afeto,
Evelyn
Surpreende de tão conseguido e belo. Uma imagética e simbolismo ímpares.
só para dizer - o que não seria preciso... - que é um poema perfeitamente fabuloso.
Então "aquela" do lenço de dizer adeus... é um sonho de ideia e escrita.
Venho, em meu nome pessoal como autora do post “Amar”, e em nome de Líria, como administradora do blog OLHAI OS LÍRIOS DO MACUÁ, agradecer a visita com que nos honrou.
Esperamos poder continuar a contar consigo.
Beijinhos
Mariazita
No tempo de aulas não poderei fazer tantas visitas como gostaria, mas os estudos estão em primeiro lugar.
Conto com a vossa compreensão e carinho. Venham sempre.
Um grande beijo
Líria
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