O comboio oscila nos desníveis
entre trilhos
impassível como um pêndulo
que se limita a cumprir
as leis da física.
E eu oscilo com ele.
Tentei uma vez a insurreição:
inclinar-me para o lado esquerdo
no momento em que o comboio se inclinava
para o lado direito,
e vice-versa.
Mas não consegui.
Está muito fundo em mim o jeito de oscilar
ao sabor do inimigo.
Como se fosse o seu par
numa dança brejeira.
Ou como se ele fosse
a minha pulsação.
Ou como estando eu já
no interior da morte.
E tão solidário me tornei
que mesmo que algum dia me apeasse
oscilaria sempre vida fora
com aquela cadência do comboio
inscrita nos passos.
(No sangue, em todo o caso,
talvez não.)
A.M. Pires Cabral, Que Comboio É Este
Poesia Portuguesa Contemporânea, teatro de vila real, 2005
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