Vejo esta grafia e o seu inexorável
nestas frias margens que por letras
partem à conquista de outras laudas:
as que aqui se erguem bem no centro
onde um planador – ou um avião de corda,
com as suas asas frágeis, vagarosas –
procura sobre a água um arco de platina,
procura entre as nuvens todo o azul
da absoluta liberdade, o caos possível.
Vejo o invisível (paradoxo, eu sei)
que escorre sobre o banco das viagens
ou dos arredores de tantos animais:
os de piscos lépidos, de cegonhas alçadas
nos outeiros ou de serpentes mágicas
que a memória transforma em pesadelos.
Também vejo o grafismo de quais dedos
navegam à deriva por lampejos
e sombras de outros corpos
- reais ou imaginários;
ou o dos lábios que vão no beiral
de outras línguas, de outro mosto,
de outra memória quente
que nos baste.
JOÃO RUI DE SOUSA
Grafismos, Fulgurações
sábado, 26 de abril de 2008
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1 comentário:
"Roteiro
Meu jeito visionário — meu astrolábio.
Meu ser mirabolante — um alcatruz.
De variadas coisas fiz a minha esperança
e sempre em várias coisas vi a minha cruz.
Aos padrões que em vários pontos encontrei
na rota íntima de vestes tropicais
eu dei as mãos, serenas e intactas,
as minhas dores mais certas e reais.
Nos vários sítios que — abismos —
toldaram minha voz por um olhar,
eu evitei o perigo e os prejuízos
à voz feita de calma, meu cantar.
Aos rasgos que, de outrora, evocados
foram sempre pelo seu valor,
eu dei a minha tez de dúvida e de espanto,
o meu silêncio amargo, o meu calor,
E aos pontos cardeais que em volta, vacilantes,
desalentavam já meu ser cativo,
parei o gesto, roubei o pólo sul da esperança
como lembrança para um dia altivo."
João Rui de Sousa
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