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entrei “na noite pelo lado onde há menos gente”
porque o silêncio se esbate só contra
os rostos vagos dos granitos nas calçadas
e posso respirar o sereno olhar
do que não vejo.
a cidade, essa, a cidade
grita no reverso do meu passo
e engole o eco do que adivinho. lá longe
uma mulher de espuma, junto do mar,
retribui uma palavra que perdi há décadas
quando me açoitava
nas turbulências da multidão.
“eu enlouqueço com a doçura
dos meses vagarosos”, este fevereiro tem
os mesmos 1000 anos como tinha há trinta,
exactamente quando enlouqueceste
o beijo que se partiu na minha boca
e nunca mais fui homem
de trincar outros desejos
(e nem)
de desejar bocas novas
perdido
sem me entregar
perdido
a esperar
sem esperar
só aceitar (apenas)
o aguardar da noite: que
a artificiosa luz me prenda de consolo.
(dois decalques de herberto helder, peço desculpa...) 16.02.2009
4 comentários:
Caro Augusto, por certo já reparou que sou uma grande fã de Italo Calvino, mais especificamente da sua obra sempre em releitura "As Cidades Invisíveis". Pois bem, hoje a propósito do poema e d'"a cidade grita no reverso do meu passo e engole o oeco do que adivinho", aqui lhe deixou um belo trecho para o animar:
"Se cada cidade é como uma partida de xadrez, no dia em que eu conhecer todas as regras do jogo possuirei por fim o meu império, mesmo se não conseguir conhecer todas as cidades que ele contém".
E não se inquiete, porque antes de si muitos se inquietaram, veja: " qual era o móbil verdadeiro deste jogo? No xeque-mate, no lugar do rei levantado pela mão do vencedor permanece um quadrado negro ou branco".
Fique bem.
A noite, o silêncio, o ofício, a cidade - a solidão...
O amor, a luz, o desejo, a vida - o aplauso...
E a paciência?!...
Muito bem... e bem agradecido, cara Passiflora.
e...
na poesia e, se calhar, em tudo o resto, cada palavra tem uma grandeza autónoma e uma multiplicidade de sentidos que ganha vida em cada leitor.
a paciência - a falta da dita... - pode ser (ou não) apenas ter de buscar umas palavras já com uns meses.
Todavia, a paciência - ou a sua falta- tende a ganhar notoriedade... By the way, boa resposta! Reitero Jauss quando defende a literatura como provocação e afirma que «aquele que interpreta deve fazer intervir a sua própria experiência»...
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