"Eu sou português aqui em terra e fome talhado feito de barro e carvão rasgado pelo vento norte amante certo da morte no silêncio da agressão.
Eu sou português aqui mas nascido deste lado do lado de cá da vida do lado do sofrimento da miséria repetida do pé descalço do vento.
Nasci deste lado da cidade nesta margem no meio da tempestade durante o reino do medo. Sempre a apostar na viagem quando os frutos amargavam e o luar sabia a azedo.
Eu sou português aqui no teatro mentiroso mas afinal verdadeiro na finta fácil no gozo no sorriso doloroso no gingar dum marinheiro.
Nasci deste lado da ternura do coração esfarrapado eu sou filho da aventura da anedota do acaso campeão do improviso, trago as mão sujas do sangue que empapa a terra que piso.
Eu sou português aqui na brilhantina em que embrulho, do alto da minha esquina a conversa e a borrasca eu sou filho do sarilho do gesto desmesurado nos cordéis do desenrasca.
Nasci aqui no mês de Abril quando esqueci toda a saudade e comecei a inventar em cada gesto a liberdade.
Nasci aqui ao pé do mar duma garganta magoada no cantar. Eu sou a festa inacabada quase ausente eu sou a briga a luta antiga renovada ainda urgente.
Eu sou português aqui o português sem mestre mas com jeito. Eu sou português aqui e trago o mês de Abril a voar dentro do peito.
O barco vai de saída Adeus ó cais de alfama Se agora vou de partida Levo-te comigo ó cana verde Lembra-te de mim ó meu amor Lembra-te de mim nesta aventura P´ra lá da loucura P´ra lá do equador
Ah! mas que ingrata ventura bem me posso queixar Da pátria a pouca fartura Cheia de mágoas ai quebra mar Com tantos perigos ai minha vida Com tantos medos e sobressaltos Que eu já vou aos saltos Que eu vou de fugida
Sem contar essa história escondida Por servir de criado a essa senhora Serviu-se ela também tão sedutora Foi pecado Foi pecado E foi pecado sim senhor Que vida boa era a de lisboa
Gingão de roda batida Corsário sem cruzado Ao som do baile mandado Em terras de pimenta e maravilha Com sonhos de prata e fantasia Com sonhos da cor do arco-íris Desvairas se os vires Desvairas magia
Já tenho a vela enfunada Marrano sem vergonha Judeu sem coisa sem fronha Vou de viagem ai que largada Só vejo cores ai que alegria Só vejo piratas e tesouros São pratas são ouros São noites são dias
Vou no espantoso trono das águas Vou no tremendo assopro dos ventos Vou por cima dos meus pensamentos Arrepia Arrepia E arrepia sim senhor Que vida boa era a de lisboa
O mar das águas ardendo O delírio dos céus A fúria do barlavento Arreia a vela e vai marujo ao leme Vira o barco e cai marujo ao mar Vira o barco na curva da morte Olha a minha sorte Olha o meu azar
E depois do barco virado Grandes urros e gritos Na salvação dos aflitos Esfola, mata, agarra Ai quem me ajuda Reza, implora, escapa Ai que pagode Reza tremem heróis e eunucos São mouros são turcos São mouros acode
Aquilo é uma tempestade medonha Aquilo vai p´ra lá do que é eterno Aquilo era o retrato do inferno Vai ao fundo Vai ao fundo E vai ao fundo sim senhor Que vida boa era a de lisboa.
Era um redondo vocábulo Uma soma agreste Revelavam-se ondas Em maninhos dedos Polpas seus cabelos Resíduos de lar Pelos degraus de Laura A tinta caía No móvel vazio Convocando farpas Chamando o telefone Matando baratas A fúria crescia Clamando vingança Nos degraus de Laura No quarto das danças Na rua os meninos Brincavam e Laura Na sala de espera Inda o ar educa"
"Eu vim de longe Quando o avião aqui chegou Quando o mês de maio começou Eu olhei para ti Então entendi Foi um sonho mau que já passou Foi um mau bocado que acabou
Tinha esta viola numa mão Uma flor vermelha na outra mão Tinha um grande amor Marcado pela dor E quando a fronteira me abraçou Foi esta bagagem que encontrou
Eu vim de longe De muito longe O que eu andei pra aqui chegar Eu vou pra longe Pra muito longe Onde nos vamos encontrar Com o que temos pra nos dar
E então olhei à minha volta Vi tanta esperança andar à solta Que não hesitei E os hinos cantei Foram feitos do meu coração Feitos de alegria e de paixão
Quando a nossa festa se estragou E o mês de Novembro se vingou Eu olhei pra ti E então entendi Foi um sonho lindo que acabou Houve aqui alguém que se enganou
Tinha esta viola numa mão Coisas começadas noutra mão Tinha um grande amor Marcado pela dor E quando a espingarda se virou Foi pra esta força que apontou
E então olhei à minha volta Vi tanta mentira andar à solta Que me perguntei Se os hinos que cantei Eram só promessas e ilusões Que nunca passaram de canções
Eu vim de longe De muito longe O que eu andei pra aqui chegar Eu vou pra longe P´ra muito longe Onde nos vamos encontrar Com o que temos pra nos dar
Quando eu finalmente eu quis saber Se ainda vale a pena tanto crer Eu olhei para ti Então eu entendi É um lindo sonho para viver Quando toda a gente assim quiser
Tenho esta viola numa mão Tenho a minha vida noutra mão Tenho um grande amor Marcado pela dor E sempre que Abril aqui passar Dou-lhe este farnel para o ajudar
Eu vim de longe De muito longe O que eu andei pra aqui chegar Eu vou p´ra longe P´ra muito longe Onde nos vamos encontrar Com o que temos pra nos dar
E agora eu olho à minha volta Vejo tanta raiva andar a solta Que já não hesito Os hinos que repito São a parte que eu posso prever Do que a minha gente vai fazer
Eu vim de longe De muito longe O que eu andei prá aqui chegar Eu vou pra longe P´ra muito longe Onde nos vamos encontrar Com o que temos pra nos dar"
10 comentários:
Apesar dos números...
e se ainda a tempo...Obrigado Mil
"Tejo que levas as águas
correndo de par em par
lava a cidade de mágoas
leva as mágoas para o mar
Lava-a de crimes espantos
de roubos, fomes, terrores,
lava a cidade de quantos
do ódio fingem amores
Leva nas águas as grades
de aço e silêncio forjadas
deixa soltar-se a verdade
das bocas amordaçadas
Lava bancos e empresas
dos comedores de dinheiro
que dos salários de tristeza
arrecadam lucro inteiro
Lava palácios, vivendas
casebres, bairros da lata
leva negócios e rendas
que a uns farta e a outros mata
Tejo que levas as águas
correndo de par em par
lava a cidade de mágoas
leva as mágoas para o mar
Lava avenidas de vícios
vielas de amores venais
lava albergues e hospícios
cadeias e hospitais
Afoga empenhos favores
vãs glórias, ocas palmas
leva o poder de uns senhores
que compram corpos e almas
Leva nas águas as grades
de aço e silêncio forjadas
deixa soltar-se a verdade
das bocas amordaçadas
Das camas de amor comprado
desata abraços de lodo
rostos, corpos destroçados
lava-os com sal e iodo
Tejo que levas as águas
correndo de par em par
lava a cidade de mágoas
leva as mágoas para o mar"
Poema: Manuel da Fonseca
Adriano Correia de Oliveira
"Eu sou português
aqui
em terra e fome talhado
feito de barro e carvão
rasgado pelo vento norte
amante certo da morte
no silêncio da agressão.
Eu sou português
aqui
mas nascido deste lado
do lado de cá da vida
do lado do sofrimento
da miséria repetida
do pé descalço
do vento.
Nasci
deste lado da cidade
nesta margem
no meio da tempestade
durante o reino do medo.
Sempre a apostar na viagem
quando os frutos amargavam
e o luar sabia a azedo.
Eu sou português
aqui
no teatro mentiroso
mas afinal verdadeiro
na finta fácil
no gozo
no sorriso doloroso
no gingar dum marinheiro.
Nasci
deste lado da ternura
do coração esfarrapado
eu sou filho da aventura
da anedota
do acaso
campeão do improviso,
trago as mão sujas do sangue
que empapa a terra que piso.
Eu sou português
aqui
na brilhantina em que embrulho,
do alto da minha esquina
a conversa e a borrasca
eu sou filho do sarilho
do gesto desmesurado
nos cordéis do desenrasca.
Nasci
aqui
no mês de Abril
quando esqueci toda a saudade
e comecei a inventar
em cada gesto
a liberdade.
Nasci
aqui
ao pé do mar
duma garganta magoada no cantar.
Eu sou a festa
inacabada
quase ausente
eu sou a briga
a luta antiga
renovada
ainda urgente.
Eu sou português
aqui
o português sem mestre
mas com jeito.
Eu sou português
aqui
e trago o mês de Abril
a voar
dentro do peito.
Eu sou português aqui"
José Fanha
Ainda a tempo!Vão lá 34 anos...
O barco vai de saída
Adeus ó cais de alfama
Se agora vou de partida
Levo-te comigo ó cana verde
Lembra-te de mim ó meu amor
Lembra-te de mim nesta aventura
P´ra lá da loucura
P´ra lá do equador
Ah! mas que ingrata ventura bem me posso queixar
Da pátria a pouca fartura
Cheia de mágoas ai quebra mar
Com tantos perigos ai minha vida
Com tantos medos e sobressaltos
Que eu já vou aos saltos
Que eu vou de fugida
Sem contar essa história escondida
Por servir de criado a essa senhora
Serviu-se ela também tão sedutora
Foi pecado
Foi pecado
E foi pecado sim senhor
Que vida boa era a de lisboa
Gingão de roda batida
Corsário sem cruzado
Ao som do baile mandado
Em terras de pimenta e maravilha
Com sonhos de prata e fantasia
Com sonhos da cor do arco-íris
Desvairas se os vires
Desvairas magia
Já tenho a vela enfunada
Marrano sem vergonha
Judeu sem coisa sem fronha
Vou de viagem ai que largada
Só vejo cores ai que alegria
Só vejo piratas e tesouros
São pratas são ouros
São noites são dias
Vou no espantoso trono das águas
Vou no tremendo assopro dos ventos
Vou por cima dos meus pensamentos
Arrepia
Arrepia
E arrepia sim senhor
Que vida boa era a de lisboa
O mar das águas ardendo
O delírio dos céus
A fúria do barlavento
Arreia a vela e vai marujo ao leme
Vira o barco e cai marujo ao mar
Vira o barco na curva da morte
Olha a minha sorte
Olha o meu azar
E depois do barco virado
Grandes urros e gritos
Na salvação dos aflitos
Esfola, mata, agarra
Ai quem me ajuda
Reza, implora, escapa
Ai que pagode
Reza tremem heróis e eunucos
São mouros são turcos
São mouros acode
Aquilo é uma tempestade medonha
Aquilo vai p´ra lá do que é eterno
Aquilo era o retrato do inferno
Vai ao fundo
Vai ao fundo
E vai ao fundo sim senhor
Que vida boa era a de lisboa.
O Barco Vai de Saída
Fausto
"Era um redondo vocábulo
Era um redondo vocábulo
Uma soma agreste
Revelavam-se ondas
Em maninhos dedos
Polpas seus cabelos
Resíduos de lar
Pelos degraus de Laura
A tinta caía
No móvel vazio
Convocando farpas
Chamando o telefone
Matando baratas
A fúria crescia
Clamando vingança
Nos degraus de Laura
No quarto das danças
Na rua os meninos
Brincavam e Laura
Na sala de espera
Inda o ar educa"
Zeca Afonso
"Eu vim de longe
Quando o avião aqui chegou
Quando o mês de maio começou
Eu olhei para ti
Então entendi
Foi um sonho mau que já passou
Foi um mau bocado que acabou
Tinha esta viola numa mão
Uma flor vermelha na outra mão
Tinha um grande amor
Marcado pela dor
E quando a fronteira me abraçou
Foi esta bagagem que encontrou
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pra aqui chegar
Eu vou pra longe
Pra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
E então olhei à minha volta
Vi tanta esperança andar à solta
Que não hesitei
E os hinos cantei
Foram feitos do meu coração
Feitos de alegria e de paixão
Quando a nossa festa se estragou
E o mês de Novembro se vingou
Eu olhei pra ti
E então entendi
Foi um sonho lindo que acabou
Houve aqui alguém que se enganou
Tinha esta viola numa mão
Coisas começadas noutra mão
Tinha um grande amor
Marcado pela dor
E quando a espingarda se virou
Foi pra esta força que apontou
E então olhei à minha volta
Vi tanta mentira andar à solta
Que me perguntei
Se os hinos que cantei
Eram só promessas e ilusões
Que nunca passaram de canções
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pra aqui chegar
Eu vou pra longe
P´ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
Quando eu finalmente eu quis saber
Se ainda vale a pena tanto crer
Eu olhei para ti
Então eu entendi
É um lindo sonho para viver
Quando toda a gente assim quiser
Tenho esta viola numa mão
Tenho a minha vida noutra mão
Tenho um grande amor
Marcado pela dor
E sempre que Abril aqui passar
Dou-lhe este farnel para o ajudar
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pra aqui chegar
Eu vou p´ra longe
P´ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
E agora eu olho à minha volta
Vejo tanta raiva andar a solta
Que já não hesito
Os hinos que repito
São a parte que eu posso prever
Do que a minha gente vai fazer
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei prá aqui chegar
Eu vou pra longe
P´ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar"
José Mário Branco
Bem, vejo que celebrou condignamente o dia da liberdade..
A arte ao serviço do esforço...
Estes são também bonitos, pela frescura
....
"É possível viver de pé.
Não te deixes murchar. Não deixes que te domem.
É possível viver sem fingir que se vive.
É possível ser homem.
É possível ser livre, livre, livre."
Manuel Alegre
"A arte ao serviço do esforço?
Tão só pela frescura...da frescura...
"É POSSÍVEL VIVER DE PÉ!"
É possível viver SEM FINGIR que se vive."
E este também o é (cravo), sem dúvida!
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